Que me perdoem os desenhistas, mas que a arte de desenhar é bem mais simplória que a arte de escrever, é fato que ninguém pode negar. Afinal, o que é um desenho se não uma mera reprodução da realidade? Tendo olhos para ver e algum dom ou técnica, qualquer um pode se tornar um transmutador da imagem tridimensional em uma imagem de papel.
Já a labuta do escritor é mais complexa. Exige um trabalho sincronizado, pois se escrita de forma errada, até a idéia mais genial torna-se medíocre (dos males o menor).
Pior que um texto mal escrito, é um texto fantasma, composto por fragmentos de idéias que só poderão ser colocados no papel, caso reencarnem nas mãos de um autor menos pusilânime e ocioso que o primeiro.
A verdade é que o escritor é um guerreiro e seu inimigo é ele mesmo. O campo de batalha? O papel.
Tudo começa com a tal inspiração que ocorre na mente e, é expirada por meio da mão. Quando esse procedimento não ocorre de forma minuciosa, o escritor sofre asfixia intelectual. Ter a idéia, mas não conseguir reproduzi-la no papel é como estar se banhando no próprio mundo subjetivo e de repente se ver cercado de uma areia movediça que o puxa cada vez mais para dentro de si mesmo, sufocando-o nas próprias entranhas... Constipação de idéias.
E é aí que acontece... O escritor não aguenta seu fardo. A frustração é tanta que acaba entrando em coma induzido (por ele mesmo). Com medo ele vive um longo período de abstinência (dele mesmo).
Passado um tempo, cansado da inanição intelectual, resolve voltar à ativa. Lentamente ele se levanta de sua cama, veste o robe, calça as pantufas e segue em direção à cozinha, arrastando os pés como se quisesse apenas roçar o chão. Abre o armário, observa a xícara com os dizeres “I ♥ NY”, mas prefere a outra, com o desenho da Estátua da Liberdade. Acende seu “Hollywood” e enquanto volta ao quarto, sente ódio de si mesmo por ser um brasileiro tão americano.
Senta na escrivaninha, acende a luz do abajur. Põe os óculos, e novamente sente raiva de si mesmo, dessa vez, por ser um brasileiro americano velho e astigmático.
Coloca uma mão na testa, e com a outra segura a caneta, cuja ponta já pende em sua boca... Olha para o papel.
De repente, flash back: asfixia, constipação, coma, abstinência. Ele fecha os olhos para se concentrar... Precisa esquecer o medo da frustração, mas agora, até mesmo a idéia lhe foge à mente.
Abre os olhos de súbito, e mira a xícara de café. Sente raiva de si mesmo. Não por ser brasileiro americano velho astigmático, mas por não ter honrado sua profissão até na mais simples escolha matinal.
Ele sorri. Sem hesitação, escreve as primeiras palavras do seu texto de re-estréia.
“Que me perdoem os desenhistas, mas que...”
Letícia Mueller
Já a labuta do escritor é mais complexa. Exige um trabalho sincronizado, pois se escrita de forma errada, até a idéia mais genial torna-se medíocre (dos males o menor).
Pior que um texto mal escrito, é um texto fantasma, composto por fragmentos de idéias que só poderão ser colocados no papel, caso reencarnem nas mãos de um autor menos pusilânime e ocioso que o primeiro.
A verdade é que o escritor é um guerreiro e seu inimigo é ele mesmo. O campo de batalha? O papel.
Tudo começa com a tal inspiração que ocorre na mente e, é expirada por meio da mão. Quando esse procedimento não ocorre de forma minuciosa, o escritor sofre asfixia intelectual. Ter a idéia, mas não conseguir reproduzi-la no papel é como estar se banhando no próprio mundo subjetivo e de repente se ver cercado de uma areia movediça que o puxa cada vez mais para dentro de si mesmo, sufocando-o nas próprias entranhas... Constipação de idéias.
E é aí que acontece... O escritor não aguenta seu fardo. A frustração é tanta que acaba entrando em coma induzido (por ele mesmo). Com medo ele vive um longo período de abstinência (dele mesmo).
Passado um tempo, cansado da inanição intelectual, resolve voltar à ativa. Lentamente ele se levanta de sua cama, veste o robe, calça as pantufas e segue em direção à cozinha, arrastando os pés como se quisesse apenas roçar o chão. Abre o armário, observa a xícara com os dizeres “I ♥ NY”, mas prefere a outra, com o desenho da Estátua da Liberdade. Acende seu “Hollywood” e enquanto volta ao quarto, sente ódio de si mesmo por ser um brasileiro tão americano.
Senta na escrivaninha, acende a luz do abajur. Põe os óculos, e novamente sente raiva de si mesmo, dessa vez, por ser um brasileiro americano velho e astigmático.
Coloca uma mão na testa, e com a outra segura a caneta, cuja ponta já pende em sua boca... Olha para o papel.
De repente, flash back: asfixia, constipação, coma, abstinência. Ele fecha os olhos para se concentrar... Precisa esquecer o medo da frustração, mas agora, até mesmo a idéia lhe foge à mente.
Abre os olhos de súbito, e mira a xícara de café. Sente raiva de si mesmo. Não por ser brasileiro americano velho astigmático, mas por não ter honrado sua profissão até na mais simples escolha matinal.
Ele sorri. Sem hesitação, escreve as primeiras palavras do seu texto de re-estréia.
“Que me perdoem os desenhistas, mas que...”
Letícia Mueller
4 comentários:
Muito bom, Letícia. Texto de quem realmente tem verve de escritor na veia. Eu, que também brinco de "tentar" desenhar, acho que a coisa é meio complicada nesta arte, mas concordo sim que escrever (bem) é (bem) mais difícil.
Beijo.
Mario
Excelente texto.
Ariam
Eu não sei desenhar .
Inclusive reprovei em teste de desenho .
Então o monitor disse :
- Menina , você fez jardim - de - infância ?!
- Pois você precisa voltar ao maternal para aprender a desenhar .
Snif !
Com carinho ,
Luciana do Rocio .
Le, você toca meu coração, ehhehe. Pra variar seu texto esta m,uito bom, te admiro pequena.
Beijo
Ingrid
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