sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Teoria Do Brigadeiro


Não era possível. Em seis meses, era a terceira vez que aquilo acontecia. Novamente, o “homem da sua vida” lhe abandonara. Não bastasse o primeiro e o segundo terem lhe deixado, o terceiro, que parecia o mais perfeito, agira da mesma forma que os outros dois, e, provavelmente, da mesma forma que qualquer outro homem da sua vida, ao redor do mundo, agiria, partindo sem ao menos um adeus, uma explicação ou um beijo de despedida.


Ensaiou no espelho alguns diálogos dramáticos, gravou juras de amor para testar se surtiria algum efeito de arrependimento no outro, pensou em pedir perdão. Mas, afinal, pedir perdão a quê? Nada havia feito de errado. Tratou-o como um deus, sem ciúmes, cobranças ou discussões de relacionamento. Assim como havia feito com os outros dois homens da sua vida.
Então, depois da chuva, veio o sol. Secou as lágrimas de horas, e chegou a uma conclusão que iluminou seus pensamentos. Nada mais óbvio pensar que, já que não havia feito nada errado, o problema estava nos três homens, ou melhor, em todos os homens da Terra. O que acontecia era uma aversão, a longo prazo, a pequenas atitudes doces no dia a dia. Atitudes que, no início, conquistaram-nos a ponto de se apaixonarem, tornavam-se enjoativas com o tempo. Tal qual um brigadeiro.

Sim, ela era, aos olhos masculinos, um brigadeiro. Daqueles de colher, que você deseja mais que tudo e tem que esperar um tempo até ficar pronto para o consumo. Eles a preparavam para aumentar os seus desejos, e ela contribuía para isso, não se entregando, e assim que eles davam a primeira colherada, deliciavam-se com o sabor. Ah... o brigadeiro, a espera, o calor! A segunda porção ainda era deliciosa, mas não tanto quanto a primeira. A boca, já adoçada, não mais se surpreendia com o sabor peculiar que a uma colherada atrás ansiava. Porém, a vontade ainda era grande, e zapt: lá iam eles para a terceira colher. Agora, o que antes era desejo já se transformava em gula. Já não havia mais vontade em saborear o brigadeiro preparado, mas, devido ao esforço de outrora e à tolerância ainda presente, lá ia: a quarta colherada, fatal.


Nada mais restava de desejo, gula, doce, ou espera. Reinava o enjôo e a vontade de jogar a colher, a panela e todo o brigadeiro para bem longe da vista, mas não no lixo, claro. Nenhuma pessoa normal, que ama brigadeiro, o jogaria fora, mesmo que já estivesse saciada. Apenas colocaria algo por cima da panela, para proteção, ou simplesmente deixaria na geladeira, sob risco de alteração na textura e sabor, a longo prazo. Assim que a vontade voltasse, lá estaria o brigadeiro, esperando para ser novamente devorado.


Ela era assim, ou pelo menos os homens pensavam que era. Os dois homens de sua vida abusaram da sua doçura por três colheradas, mas, na quarta, jogaram-na em um canto, sem mais explicações, e um tempo depois, voltaram cheios de vontade para umas últimas abocanhadas gulosas.


Cheia de ira, ela, reconhecendo-se como um brigadeiro, quis mudar sua maneira de ser e a oportunidade surgiria a qualquer instante, com a volta do terceiro homem ou o início de outro relacionamento.


Morria um brigadeiro, nascia uma Coca-Cola... mas aí já é outra teoria.

Letícia Mueller

Um comentário:

Anônimo disse...

Letícia, você é um brigadeiro transformado em dois amores. ;-)
Beijo, Fofulety.

Mario