quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Percepção Sobre A Vida


Ele parece perdido, fora do seu mundo. Põe a mão no bolso, rói a unha, olha o relógio. Aparente nervosismo, quando percebe alguém observando, disfarça. Olha para o chão, olha para a porta...
Parece esperar por alguém que vai chegar, ou não. Olha as outras mesas, as várias pessoas que passam, sentam e se levantam, mira a moça que não é moça. Consulta o celular, torna à porta. Entre uma coisa e outra seus olhares se cruzam. Primeira percepção.
Mas ele está ansioso, roda o celular na mão, guarda no bolso, torna a pegar, disca e desliga sem saber como acabar com sua angústia. Novamente seus olhares se cruzam. A ligação é inevitável, ele está impaciente, indignado por não obter a resposta que espera. Parece quase desistir. Inicia, então, um contato com a mesa ao lado, gentilmente cede o porta-guardanapos, cogitando talvez dar um pouco de atenção às moças, mas volta ao seu objetivo. Liga novamente. O garçom retira uma cadeira, restando agora somente mais uma além da sua. Tudo indica que está à espera de alguém que não chega. Toma seu chopp, a mesa ao lado já parece mais interessante. Dá uma olhada, mas sem desgrudar da porta. Novos olhares se cruzam. Segunda percepção.
Lança seu olhar como se estivesse intrigado com alguma coisa. Parece ter notado que mais alguém presta atenção em seus movimentos. E não desiste. Torna a olhar para o relógio, insistente. A porta é a chave entre dois mundos. Não acredita. Está ali, no centro do mundo, e, no entanto, sozinho. Não sabe mais o que deseja. Seus olhos miram, sem nada enxergar. “O que esperar de alguém que espera?” Novamente ao telefone, desta vez com um sorriso sarcástico. O que passa por seus pensamentos, o que tanto quer? Novos olhares... terceira percepção.
Curiosidade, interferência e o destino. Só falta mais uma barreira para que haja uma aproximação. Mas, ainda, o foco é a porta. Tenta se distrair, não dar tanto a entender a sua aparente frustração. As meninas da mesa ao lado vão embora, uma oportunidade perdida. Mira o celular novamente, desta vez desenganado. Seu meio de comunicação tornou-se fútil. Levanta-se, muda de mesa, fica mais perto da sua libertação. Cada vez mais perto, seus lindos olhos escuros deixam de procurar. Parece ter encontrado algo de que não quer abrir mão, é como se tudo aquilo fizesse parte de uma situação premeditada.
Agora tudo lhe parece familiar, foi quebrado o silêncio. Os olhares tomam forma e se fundem, transformando a noite quente de início de verão na primeira entre Vinícius e Ana Luíza. Um novo ano chegou...



Angélica Carvalho

3 comentários:

Karime disse...

Uia! Que eu tava esperando ansiosa este texto do boteco! Cheguei a visualizar a sequência das cenas.
Shô! Muito shô!

beijos

Anônimo disse...

Um brinde a Vinícius e Ana Luiza, que a espera tenha acabado para ambos, e para sempre.
Beijo, Ange.

Mario

Anônimo disse...

Muito bom. Ficou bem legal o texto de boteco! Já me imaginei vendo as cenas... e elas pareciam bem reais.
Bjs. Katia