terça-feira, 22 de fevereiro de 2011


Padrões e Medidas





Alguns anos atrás sofri um acidente de carro que me deixou muitas sequelas fisicas e emocionais. Tenho várias cicatrizes nas mãos, sendo que a palma da minha mão direita parece ter sido “bordada”. Perdi a sensibilidade nas pontas de alguns dedos, minhas impressões digitais foram alteradas em dois desses dedos e ganhei uma lesão “complicada e inoperável” segundo os médicos, na região do pescoço. Além de burcites no ombro e quadril direito.




Certa vez, fui a um médico ortopedista para tratar as dores e o desconforto que as bursites me causavam. Na verdade eu nem sabia que eram bursites e muito menos que eram sequelas do acidente. Depois de alguns minutos de consulta ele olhou as minhas radiografias e partil o exame. Então logo de cara ele avaliou meu corpo já dizendo: “Hum, está acima do peso.” Em seguida fez outras avaliações e então deu o diagonistico:


- Karla, você tem bursites e você está assim porquê você é gorda.
Sim, o médico me chamou de gorda na minha cara, sem nehum rodeio, mas não foi só:
- Olha você precisa emagrecer, vá fazer corridas, ou andar de bicicleta, entre numa academia e puxe muito ferro. Perca peso, só assim você vai ser magra, bonita e feliz.
Numa tacada só o médico me chamou de gorda, feia e infeliz. Mas agora vem a melhor parte da história: a receita. O remédio para tratar a minha bursite e de quebra resolver todos os meus problemas de obesidade, feiura e infelicidade? SIBUTRAMINA.


Um médico ortopedista, que se orgulha de ser médico do esporte e blá, blá, blá, me receitou SIBUTRAMINA. Sem contar tudo o que ele me disse a respeito da mulher dele, “que um dia já foi assim como você, Karla, mas agora está linda e feliz”. Eu posso imaginar a felicidade transbordando essa moça, alias transbordando não, porquê transbordar é coisa de gordo, ela deve conter o transbordamento.



Graças a esse médico eu acordei para um mal muito maior do que o fato de estar acima do peso, o mal do preconceito. As palavras dele me doeram mais do que as cicatrizes que eu carrego, passei uma semana inteira chorando chapada de SIBUTRAMINA, perdi dois quilos e não me senti nem bonita, nem magra e muito feliz. Então eu parei com o remédio, procurei um outro médico e decidi que gorda ou magra ninguém ditaria como eu devo ser.



Os padrões de beleza atuais indicam que tem que ser magra para ser feliz, pois digo que os padrões estão errados. O que determina a minha felicidade passa muito longe da balança e dos manequins 34/36. Meu corpo, minha casca, minha matéria não indica quem eu sou e eu ainda prefiro ser cheinha a ser vazia.
Tenho amigas que vivem a baixo de dieta, que tomam SIBUTRAMINA como se fosse bala e acham isso muito normal, faz parte do cotidiano delas. Eu sei que essas amigas me julgam, e que provavelmente comentam a respeito do meu corpo e do meu peso e pensar nisso me magoa, mas sei que o fato de não seguir o padrão delas deve soar estranho afinal eu estou na contramão, não elas.



A verdade é que clinicamente e fisicamente eu estou bem, não tenho problemas de saúde, nem incomodos por conta do meu peso. Faço caminhadas diariamente e yoga, sou vegetariana e tento ser moderada na hora de me alimentar, mas realmente não me preocupo em perder peso. Minha preocupação é me manter saúdavel e bem comigo mesma.
Obvio que algumas vezes quando vejo minha barriga fico deprimida, mas isso passa e eu não vou abrir mão de ter uma vida longe de moderadores de apetite, nem de comer o que gosto e me dá prazer e muito menos vou me esforçar para fazer parte de um padrão, de uma medida. Talvez um dia eu faça uma lipo para diminuir a barriga, talvez não. Ser gordinha para mim virou um estilo de vida que eu assumo, tenho orgulho e defendo.



E para você que está lendo isso e rindo achando que eu sou louca, que onde já se viu ter orgulho de ser gorda, aqui vai um alerta: ser magro não é sinonimo de felicidade e muito menos de bem estar. Aceitar-se , valorizar-se e gostar de si mesma sim, pode ser o primeiro passo para ser feliz, independente do seu peso ou manequim.


Karla de Oliveira






Fonte: http://revistamarieclaire.globo.com/EditoraGlobo/componentes/article/edg_article_print/1,3916,1162418-1740-1,00.html
http://casadagabi.com/gorda-quanto-pesa-seu-preconceito/
http://mulherao.wordpress.com/2011/02/22/crystal-renn-e-a-pressao-para-continuar-a-ser-uma-modelo-gordinha/
http://www.medinforme.com/ser-uma-gordinha-feliz-pode-torna-la-mais-saudavel/

Foto: Reprodução. http://mdemulher.abril.com.br/blogs/dieta-nunca-mais/2009/12/fisiologista-da-dicas-para-voce-se-pesar-corretamente/


2 comentários:

Anônimo disse...

Oi Karla! Ótimo texto, parabéns. É bom alertas as pessoas mesmo sobre esses assuntos e este preconceito estereotipado.
Sempre vivi em guerra coma balança, sim, ja tentei me incluir nos padrões sociais de beleza, apelei para sibutramina, perdi 4 kg em 15 dias, feliz por isso? Não, parecia um cão raivoso, tudo me atingia psicologicamente, me irritava fácil explodia coma mesma facilidade e os 4 kg perdido levaram também alguns amigos e familiares que se afastaram devido aos meus surtos psicóticos... Parei de tomar o remédio por conta própria, quando comecei a ter vertigens, mal estar, ansiedade, palpitação e insônia, com isso, em menos de um mês engordei 8 kg, isso mesmo, o dobro daqueles magicamente perdidos, recuperei 8 kg e minha sanidade mental, o que valeu muito mais a pena.

Beijão
Fernanda Bugai

Leticia Mueller disse...

Caramba Karla, que cara sem noção.

E digo cara porque isso aí não pode nem ser chamado de médico.

Ele deve ter sido um desses que no primeiro dia de aula da faculdade, quando o professor pergunta porque resolveu fazer medicina, respondeu sem nenhuma vergonha:

-Pelo dinheiro.

Beijos.