segunda-feira, 31 de maio de 2010

Semana de tema livre

Embriagados No Verde E Amarelo

E o ano é de Copa do Mundo, ano de eleições.
Gente que se movimenta pra lá e gente que se movimenta pra cá! Vamos lá torcedores eleitoreiros vistam suas camisas e defendam seus partidos!
A taça do mundo é nossa ♪ . E a cúpula do Estado é “deles”...
E assim vamos, ludibriados no verde e amarelo nos deixamos levar, nos deixamos esquecer o mensalão, da assembléia, do executivo, do legislativo, do judiciário e de repente já é setembro estamos comemorando o hexa ou estamos ocupados demais xingando os hermanos.
E de repente já é outubro, ganhamos um tostão ali, uma churrascada aqui, uma caneta, um boné uma bolsa disso ou daquilo ali e “eles” continuam lá... Diversão todos merecem, concordo, sou patriota, adoro Copa do Mundo. São trinta dias de expectativas e não discordo que somos o país do futebol, sim, a melhor mão de obra é nossa (ou seriam pés de obra?). Mas alguém pode, por favor, ao menos este ano, desta vez, perceber o que acontece a nossa volta enquanto isso?
O festival da bola abre espaço para o festival da prótese, das muletas, das cadeiras, das panelas, dos cobertores, do cimento, das contas de água e luz e por aí vai uma imensidade. Coincidências a parte em julho começam as campanhas oficiais para eleição, escolhemos Deputados, Senadores e Presidente da República!
República? Sim, informando, o Brasil aparentemente é uma República (do latim Res publica, "coisa pública") para aqueles que já estejam em dúvidas se aquele espaço do cerrado brasileiro era o teatro nacional, depois de tantas peças encenadas ou em cartaz.
Mas porque se preocupar com isso, o penta o hexa são tão mais importantes não é mesmo? Afinal, quem quer a vara para pescar se é tão mais conveniente ter o peixe frito já na boca para comer?


Fernanda Bugai

domingo, 30 de maio de 2010

Tomando Sorvete Com O Doutor Vovô



Antes de ontem, em companhia de uma pessoa de grande estima para mim, estava a observar o freezer de sorvete em um bar. Não fazia nem dez segundos que havíamos soltado o 20º comentário sobre o clima de Curitiba. Estávamos todos com os aparatos de frio: casacos, cachecóis, mais casacos, ceroulas e luvas. Mas mesmo com todo o conjunto de coisas, que nos fazia pensar em cama, cobertor e aquecedor, não superava o fascínio de mirar o freezer.
Que freezer lindo. Cheio de sorvetes, de todos os sabores, cores, tamanhos e aquele gelinho que gruda na parede. Não tenho idéia de quanto tempo fiquei estática fitando a caixa de gelo. Passaram inúmeros pensamentos em minha cabeça e apenas um pode ser pronunciado. “Ai que vontade de tomar sorvete!”
Logo após meu comentário vi a cidadã acenando com a cabeça em sinal de aprovação. Nesse momento dei continuidade ao meu insight. “Mas porque que no inverno, apesar do frio, dá mais vontade de tomar sorvete?”
Passei a infância ouvindo meu avô dizer que o certo é tomar sorvete no inverno, porque não dá aquele choque de corpo quente e suado com o gelado do sorvete, vulgo choque térmico. Meu avô tinha um pequeno ritual para me servir sorvete: Me fazia sentar na cadeira mais alta da sala, trazia dois potinhos com sorvete e dois copos de água, para mim e para ele. Era uma colherada de sorvete e um gole de água, segundo ele, para não me dar dor de garganta. E por incrível que pareça, nas anedotas de minha infância com meu avô não tive sequer uma inflamação.
- Considerações: Especialistas explicam que o sorvete, por si só, não é prejudicial. O que acontece é que ele ajuda na mudança brusca de temperatura da faringe, situação que, juntamente com outras questões, pode facilitar uma infecção. - Por isso a água em temperatura ambiente, genial Vovô.
E pensando sob o ponto de vista estético, foi aí que dei continuidade ao meu diálogo na frente do freezer congelante. O sorvete parece mais bonito no inverno. Dá a impressão que somente no inverno você entende, de fato, qual é a temperatura de um sorvete, o quanto é gelado, quem sabe até comparando a você mesmo andando contra o vento frio e úmido de Curitiba. No verão, o sorvete parece com você também: de regata, sunga branca, de havaianas, suado, besuntado com óleo bronzeador sob um sol escaldante. Você olha o freezer e ele mais parece um forno. Não há o gelo nas paredes já que as pessoas abrem freneticamente sua tampa em busca de refresco. No verão, o sorvete é quente! Você o segura e ele derrete por entre seus dedos, misturando-se com o óleo bronzeador fator 2 e 3/4 - Um nojo.
Ah, o inverno... experimente tomar um sorvete! O sabor é outro, a consistência é outra e pode-se caminhar por Curitiba inteira com uma casquinha intacta nas mãos.
Ah, o inverno...


Larissa Santin

sábado, 29 de maio de 2010

Melhor Do Que Uma Serra


Ai que dorzinha que ela sentia no dedo indicador. Justamente no indicador, a sua melhor ferramenta para raspar formas de bolo, tirar tatu do nariz e cera do ouvido. O que seria dela sem aquele dedo?
Ó, Gabriela chorava só de imaginar. Havia coisas que não se podia fazer sem determinada parte do corpo, e o dedo indicador era o que mais necessitava. Não era como um pé, por exemplo, que a gente só usa pra andar. Afinal, Gabriela não só preferia engatinhar, como tinha plena consciência de que o fazia melhor do que caminhar. Logo, o pé era inútil.
Ou ainda os milhares de fios de cabelo, que só serviam pra mãe vir brigar (“Não penteou o cabelo de novo, menina? Vemcácomamãe, vem”), pra dar nó no gira gira, e pra menino puxar quando dá briga. De quando em vez, acontecia algo legal e caía chiclete no cabelo, mas isso era difícil. Gabriela daria graças se um dia acordasse e visse sua cabeleira sobre o travesseiro, como se ela tivesse os perdido todos.
Outra coisa inútil era o tal do nariz, que mais parecia feito pra levar bolada. Como acertavam o nariz da Gabriela! Ou era culpa das bolas, ou do nariz dela. Vai saber se os dois acusados não conversavam entre si e ficavam se provocando nas aulas de Educação Física:
- Idiota, idiota, hoje você não me acerta cara de cocô, dizia o nariz.
- Idiota é você seu, seu, seu, nariz de neném recém nascido, retrucava a bola.
- Neném? Eu já tenho sete anos! Emburrava o nariz.
E pronto, a bola aproveitava a deixa e ia direto pro rosto da Gabriela.
Mas tinha algo que a intrigava ainda mais: os seus dentes. Ô negocinho de lua! Um dia, lhe dava o prazer de comer uma bala bem dura de morango, mastigando-a com força e ouvindo o som alto do CREC CREC ecoando na sua cabeça, e no outro, a obrigava a triturar aquelas coisas nojentas como a cenoura, brócolis, rúcula e etc... sem contar que toda a vez, depois que comia, tinha que ficar horas perdendo seu tempo escovando os dentes. Se pudesse escolher, ficaria desdentada e faria uma papinha só com os seus pratos e sobremesas preferidos para comer todos os dias.
Não adianta. Gabriela poderia ficar horas tentando achar as utilidades de cada milímetro do corpo do ser humano e não encontraria nenhum que tivesse mais atributos do que o dedo indicador, justamente o seu pedaço que estava comprometido. Ela precisava desse dedo, até o negociaria com o médico caso fosse necessário. Faria qualquer troca, cobriria qualquer oferta.
O pior é que não bastasse a sua utilidade intrínseca, o tal fura-bolos ainda criava funções para partes inúteis, como o umbigo.
“Ai que delícia mexer o dedo no umbigo, ai que delícia o cheiro que fica lá dentrão do umbigo, ai que delícia colocar o umbigo pra fora”... Gabriela ficava louca com a combinação umbigo+dedo.
Mas, um sem o outro até que sobrevivia, mas o outro sem o um, era desvalidez na certa.
Gabriela foi falar com a mãe sobre a dor, já ameaçando fugir caso o médico quisesse arrancar o dedo.
- Olha mãe, eu não posso dá o meu dedo, tá? Se me entende num é? Então assim, se ele for arrancar meu dedo, eu saio correndo e a gente se encontra aqui em casa tá?
A mãe ouvia cada palavra da filha e concordava seriamente com a cabeça.
Quando chegou no consultório, Gabriela mal se mexia, atrapalhada com suas mãos dentro de um saco que estava dentro de uma bolsa que estava dentro de um casaco.
Ela olhou de nariz empinado para o médico, apesar de que não teria outra escolha.
Seu nariz batia bem no joelho do doutor.
Sem se dar ao trabalho de sentar, cerrou os olhos, arcou as sobrancelhas, estufou o peito, e disse, depois de encher os pulmões com bastante ar:
- Eis aqui o meu dedo.
E na ponta dos pés, colocou seu fura-bolo sobre a mesa do doutor, cheia de coragem.
Gabriela virando o rosto com medo de notar alguma reação do doutor, tratou de fechar bem os olhos, pra não ver se quer uma fresta do que estava acontecendo.
Enquanto isso, o homem examinava seu dedo, pegando-o, apertando-o, olhando-o de perto, cheirando, mordendo, lambendo.
O médico realmente analisava o indicador de Gabriela, e ela realmente estava com muito medo.
Quando sentiu que a consulta já estava chegando ao fim e que já era hora de ouvir o diagnóstico, a menina abriu os olhos lentamente, e antes de se virar totalmente para o doutor, olhou sua mãe e com uma piscadela, garantiu que o plano estava em pé.
Confirmada a fuga, Gabriela muniu-se de coragem, e mirando o homem gigante de jaleco branco, perguntou com a voz mais grave que poderia ter uma menina de 7 anos:
- O que eu tenho?
O médico mal teve tempo de abrir a boca e a menina saiu correndo pela porta a mil por hora, segurando seu dedo com a outra mão como se carregasse o coração do seu bichinho de estimação.
A mãe e o homem que ficaram para trás levantaram-se assustados e saíram atrás de Gabriela, mas não tiveram que ir muito longe.
Já a encontraram na porta da clínica, caída no chão, com os joelhos ralados, aos prantos e escondendo as mãos por debaixo da blusa.
- Mãe, tá doendo.
A mulher olhou para o médico, que imediatamente pegou em ambas as mãos da menina e examinou-as. Depois de cerca de 1 minuto, disse:
- Venha Gabriela, vamos voltar lá pra dentro.
Enquanto Gabriela olhava para os pés e a mãe lia uma revista na sala de espera, o médico solicitava duas talas. Para o dedo. Indicador.





Letícia Muller

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Dor De Âmago


Levanta meu vestido
Pra me deixar molhada
Com sua língua
Com seu suor

Mente para que eu possa me sentir melhor
Faz-me sua puta para eu me sentir mulher
Usa o meu corpo só quando quer
E ainda consegue me fazer pensar
Que posso tê-lo quando quiser

Quase me machuca com sua falta de carência
Com suas frases bem feitas
Com seu desapego
Com sua ausência

Viola minhas permissões com sua indecência
Que eu gosto, e calada, peço mais
Estupra meus conceitos,
Assistindo minha impotência

A barba mal feita roça-me o âmago
Arrepia-me os sentidos
Os seus dedos longos
Buscam em mim meus segredos escondidos




Jéssica Ferreira

quinta-feira, 27 de maio de 2010

A Nuvem, A Estrela E O Forte Como Pedra


Eirapuã teve seu nome na noite em que nasceu, quando sua mãe olhou para o céu e viu brilhar uma estrela mais forte. Enquanto a menina vinha ao mundo pelas mãos de Eiruba, a mais experiente parteira da tribo, e abria os olhos pela primeira vez, Hurassí se despedia da filha tocando levemente seu rosto e fechando os olhos. Eirapuã teve sua primeira perda... tão pequena e já podia sentir a dor.
Itagiba, pai da menina, sempre forte em seus sentimentos, disse que daria a Eirapuã tudo o que sua mãe poderia ter sonhado, e que faria da menina, a mais rica de todas as tribos. Resolveu deixar a menina protegida de todo o mal que pudesse atravessar seu caminho e para isso, a mantinha durante o dia, longe da tribo, em um recanto de águas naturais e cercado de árvores densas, onde lhe ensinou a pescar e caçar. À noite, a levava com cuidado para dentro da oca, sem que ela pudesse participar das confraternizações típicas da tribo. E assim, Eirapuã estava passando por sua segunda perda, tendo delimitados seus pensamentos e frustradas suas relações.
Foi assim, até os doze anos quando a menina virou mulher e, sem jeito, e sem saber o que fazer, foi ter com Eiruba, escondida do pai. Eiruba viu a menina e não conteve sua emoção ao ver que a menina estava tão parecida com a mãe. Eirapuã disse não ter muito tempo e pediu que a ajudasse com aquele “corte” que não parava de sangrar. Eiruba explicou tudo a Eirapuã, enquanto ajeitava seus cabelos e pintava seu rosto, como fazia com sua mãe, quando ainda era viva.
- Eiruba, como era minha mãe?
- Sua mãe era bonita como um dia de sol, pequena. Seu pai lhe contou dela?
- Ele contou que ela fechou os olhos quando eu abri os meus.
- Tinha muito amor dentro do coração, tanto, tanto, que quando fechou os olhos, ainda deu pra escutar seu coração batendo por algum tempo.
- Eu sinto uma dor aqui, Eiruba, sempre que olho para o céu e vejo uma estrela brilhar – disse a menina colocando as duas mãos no peito.
- Sua mãe olha por você Eirapuã, e um dia você entenderá o que essa dor significa.
Voltou para a oca antes que o pai voltasse e desse por sua falta e se pôs a pensar sobre o que Eiruba havia lhe falado. Itagiba chegou e viu a menina diferente, pintada e com os cabelos colocados para o lado e furioso perguntou quem havia lhe ensinado aquilo. Eirapuã, assustada, contou a verdade, disse que não sabia ao que fazer, que seu pai nunca a havia deixado estar com outros da tribo e que ficou com medo de morrer e deixá-lo sozinho e que, por isso, tinha ido procurar Eiruba.
Por um segundo Itagiba ficou calado. Virou-se e se deu conta do mal que estava fazendo à filha privando-a do convívio dos outros. Várias missões já haviam passado por aquela tribo ensinando sobre o mundo moderno, os costumes da civilização, tecnologia, ensinando a língua latina às tribos. Eirapuã foi criada longe disso, nada sabia sobre os povos, as culturas ou qualquer tipo de informação que a ajudasse a crescer. Decidiu então que era hora de partir e fazer valer a promessa que havia feito. Fazer da menina, a mais rica de todas as tribos.
Itagiba levou Eirapuã à cidade mais próxima de sua tribo, onde com muita paciência e perseverança, a apoiou a aprender sobre o mundo e como sobreviver a ele. Aprendeu sobre as pessoas, sobre o bem e o mal, aprendeu sobre como se vestir, se portar, cursou escolas, faculdades, aprendeu a falar outras línguas, especialmente o inglês de sua professora tão dedicada. Itagiba, sempre ao lado da filha, a viu crescer e tornar-se uma ilustre profissional dedicada às Letras e ao magistério. Eirapuã escreveu alguns livros e sabia que sua missão era disseminar conhecimento e apoio... E, sempre mencionava a tal dorzinha no peito que vinha quando olhava para o céu e via uma estrela, ao seu médico – um senhor espírita e já muito amigo de Eirapuã - que, até àquele momento, não havia conseguido diagnosticar nenhum mal físico.
No dia em que Eirapuã recebeu um prêmio pelo trabalho voluntário com crianças de tribos pobres do sul da África, estava eufórica. Recebeu todos os cumprimentos de seus colegas e superiores. Mal esperava para chegar em casa e mostrar ao pai, já velhinho, que tudo o que o pai sonhara a ela, havia acontecido. Ao chegar, viu seu pai sentado na cadeira de balanço com um cobertor nas pernas e um pequeno bilhete na mão que dizia:
“Minha Estrela. Fizemos tudo como deveria ser feito. Estou indo encontrar minha Nuvem”.
Sentiu ainda mais forte desta vez aquela dor. Era como se fosse estourar seu peito, e ao derrubar as primeiras lágrimas, deu um grito e viu tudo enegrecer, fechando seus olhos em seguida. Sonhou que estava em sua tribo e que Eiruba, ao lado de seus pais, estendia a mão a ela e dizia:
“A dor que nasceu sentindo transformou-se em silêncio. No amor e na dor se traçam os caminhos, nas vitórias os degraus, nas perdas o cajado. Caminhe sempre em direção ao céu e lá encontrará todas as suas respostas”.
Ao abrir os olhos e despertando lentamente, Eirapuã se vê cercada por seus colegas. Seu médico aproxima-se e pergunta:
- Sente-se bem, Eirapuã?
- Está doendo aqui...
- Seu peito, Eirapuã... é natural, você teve uma emoção muito forte hoje. Acalme-se, vai ficar tudo bem.
- Doutor, esta dor me acompanha a vida toda. Como pode ter certeza de que vai ficar tudo bem?
- Descobri a causa da tua dor.
- É mesmo? E é grave?
- Rs. Depende de como encara sua vida.
- Meu pai me ensinou a entender a vida, doutor. Posso entender o que tiver pra me dizer. O que eu tenho?
- Saudade... palavra que não existe na tua língua mas eu vou lhe explicar...


Angelica Carvalho

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Doenças Que a Dor de Cotovelo Causa


Ela foi humilhada e traída...
Isto causou-lhe uma ferida...
No íntimo do seu interior,
Que gerou todo o tipo de dor!

Primeiro ela teve dor de cabeça...
Querendo que a saudade não vença!
Depois ela ficou com dor de barriga...
Por causa de uma grande intriga!

Então ela foi ao doutor...
Queixar-se de sua dor!
Ela vez exames variados...
De todos os tipos e lados!

Mas o resultado não deu nada de ruim...
O que eram aquelas dores enfim?
Dias depois ela queria ficar, realmente, doente...
Pois desejava morrer por uma paixão carente!

Sentido mágoa ela foi ficando nervosa...
E isto gerou uma úlcera perigosa!
O médico pediu para ela se acalmar...
Mas ela não parava de dar socos no ar!

A cada dia que passava ela sentia mais rancor...
Por ter sido abandonada pelo seu amor!
Meses depois ela descobriu que a pressão aumentou...
E, dentro do seu espírito, a alegria se calou!

Depois de tanta dor, doença e ferida...
Ela passou a ter compulsão por comida!
Ela foi ao psiquiatra e tomou antidepressivos...
Mas nada deixou sua alma e espíritos ativos!

Uma amiga lhe falou que tudo aquilo era conseqüência...
De uma paixão sem coerência e paciência...
Sua colega disse que era dor de cotovelo...
Então naquele dia ela teve um pesadelo:

Sonhou que estava num hospital...
Com febre e passando muito mal!
Naquele dia frio e chuvoso...
Ela sentiu um calor pavoroso!

Saiu só de regata na tempestade...
Pegando pneumonia de verdade!
No hospital ela recebeu um ramalhete...
Junto com um negro bilhete:

Era seu ex-namorado dizendo que iria se casar...
Assim ela se entristeceu e veio a desencarnar.



Luciana do Rocio Mallon

terça-feira, 25 de maio de 2010

Já Vi Esse Filme Antes


Certa noite cheguei em casa. Estava munida de bombons de chocolate e dois filmes que fazia tempo que ele estava com vontade de assistir. Pensara o dia inteiro naquela noite, nos doces que iríamos comer debaixo das cobertas vendo um filme. Não queria mais nada, a não ser olhar aquele belo sorrido que ele tinha, a sua expressão quando via os chocolates que ele tanto gostava e ouvir as resenha que fazia quando eu pegava o filme que ele queria assistir, me recomendando e contanto como fora produzido, por quem, quais eram os atores (e eu por dentro, ouvia como se nunca tivesse ouvido falar da história, mesmo que já tivera). Naquela noite, queria tudo aquilo de volta, e poderia querer da mesma forma por anos.
Percorri pelo corredor, na busca daquela face encantadora que sempre me esperava lendo um livro na cama. Mas naquele dia, encontrei uma mala em nosso recanto. “Iríamos viajar e eu estraguei a surpresa”, pensei. Logo me toquei que não, se assim fosse, ele teria arrumado tudo antes e não deixaria eu ver, pois sabia o horário que eu chegava. De repente, ele saiu com uma blusa que nunca tivera usado antes, e tantas vezes insisti para que ele a usasse. Olhou-me sério, com o respeito que ainda sobrara por mim. Cumprimentou-me. Retribui. Não entendia, mas ao mesmo tempo não queria entender. Talvez eu tivesse feito algo errado ou alugado os filmes errados algum dia. Mas ele queria tanto ver “Sinais”, onde eu tinha errado na escolha?Me dei conta outra vez que não tinha tirado o filme da sacola, então a possibilidade dele não ter gostado da minha escolha era nula. O sinal estava evidente: a escolha que fez por mim já não lhe bastava tanto. Ou nada.
Pegava suas coisas com a mesma agilidade de quando se mudou para ali. Meus olhos já não eram um ponto fixo para ele olhar. Sentei-me na beira da cama e joguei as sacolas de um modo que os bombons se espalharam pela cama, e um dos filmes saltou. Olhava para o chão, desolada. Olhei de rabo de olho ele parar por um momento e pegar o filme. “Amor, ódio e traição”. Tantas vezes ele havia falado sobre aquele filme. Jogou novamente na cama, de uma forma ríspida. Pegou a mala, e caminhou até a porta. Parou. “A única coisa que eu jamais poderia imaginar é que viveria na vida real a história deste filme”. Passaram-se as horas, eu comia e assistia ao filme aos prantos. Passaram-se os anos. Hoje, dói aqui...na minha consciência.


Bianca Nascimento

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Tema da Semana: Doutor, é aqui que dói.

Passividade

Silvia era completamente apaixonada por Alexandre, por ele fez e fazia loucuras. Alexandre, no entanto não correspondia a tanto amor e devoção, era casado, mantém com Silvia um romance as escondidas no trabalho, tratava a garota com desdenho muitas vezes, melhor dizendo, um instrumento sexual ao seu dispor, bonitinha, gostosinha, arrumadinha, diferente da sua esposa que também recebia o mesmo tratamento, mas já estava na casa dos quarenta anos, batalhou duro ao lado de Alexandre para que conseguissem ser o que hoje são possuírem o status que possuem, mas ele também não a valorizava. Para Alexandre mulher que chega aos trinta chega também no prazo máximo de validade.
Sabiam uma da outra como uma verdade velada para Alexandre. Letícia a esposa, apesar de saber das escapadas do marido e saber também das escapadas permanentes com Silvia preferia tapar o sol com peneira, tinha medo, medo da exposição pública, medo de perder o conforto que o marido lhe proporcionava, não reconhecia que Alexandre chegou aonde chegou também pelo esforço, apoio e dedicação de Letícia, mas o medo persistia, medo de não poder criar os filhos ainda pequenos, medo dela mesma, medo de sua covardia. Silvia sabia de sua condição de substituta, ela tinha a cama, e nada, além disso, nas festas e jantares era Letícia quem comparecia, nas reuniões de final de ano, viagens de férias ao exterior era Letícia quem estava lá e Silvia tinha o resto, o horário de almoço, uma escapada na hora do futebol, fim de semana jamais, somente quando Letícia viajava para casa dos pais, mas Silvia não reclamava acreditava que o seu amor fosse maior que tudo, para ela bastavam as migalhas de atenção de Alexandre, estava cega, embebedara-se pela paixão, jamais sequer teve vontade de assumir o papel principal.
Até que um dia, como que uma peça que o destino pregara naquele trio, Silvia e Letícia se encontram em um salão de beleza, se esbarram, educadas e gentis trocam cumprimentos e se mantém cortês. Mas a ira, a raiva e o ódio tomam conta de uma e outra e a partir daquele momento Silvia e Letícia abrem seus olhos, percebem a vida que levam o nada que possuem, amavam uma pessoa incapaz de amar, um homem egoísta preocupado com seu status e apenas isso incapaz de olhar a sua volta.
Resolvem ao mesmo tempo, sem saber uma da outra a virar o jogo, resolvem jogar tudo para o alto e apostar no tudo ou nada. Ligam para Alexandre simultaneamente perguntam onde ele estava ele fala para ambas que está no trabalho e dentro de duas ou três horas está dispensado e retorna a ligar mais tarde. Para Alexandre sempre foi muito fácil lidar com a passividade de ambas, ele detinha o controle. Três horas depois a secretária de Alexandre avisa que Silvia marcara uma consulta de urgência com ele, ele consente e diz que a secretária já pode ir embora.
Aguarda a chegada dela imaginando ser mais uma rapidinha depois do expediente e que depois iria jantar com sua família feliz enquanto Silvia juntava suas roupas e seguia até em casa. Mas dessa vez foi diferente, Silvia chegou com o mesmo vestido insinuante, acompanhada de Letícia e ambas disseram querer uma consulta. Alexandre já previa o escândalo quando percebeu a calma de ambas.
Meio atônito com aquela situação e a leveza de ambas, Alexandre pergunta o que sentiam as duas então com muita delicadeza retiram de uma sacola um pacote.
- Doutor é aqui que dói!
Enquanto elas abrem aquele pacote ensopado de sangue, Alexandre percebe dois corações humanos perfeitamente retirados e frescos. Corações infantis. Naquele momento o mundo desaba sobre a cabeça de Alexandre que deixa de lado sua frieza, a rigidez e percebe que não foi o coração delas que doía, tampouco de seus pequeninos filhos, naquele momento o coração dele que doía quem sentiu a dor da frieza e da indiferença foi Alexandre ao perder em decorrência de suas atitudes seus bens mais valiosos.


Fernanda Bugai

domingo, 23 de maio de 2010

Clímax Em Looping


Entrou esbaforido pela porta, olhando para trás mesmo com ela fechada, como se houvesse algum segredo que ninguém mais no mundo pudesse saber. E havia. Bem guardado na sacola plástica que segurava contra o peito.

- O que aconteceu, Gustavo?

Deixando Julia com a caneca de café equilibrada no ar e sem dar qualquer esclarecimento, Gustavo passou a adentrar pela casa, seguido por ela, cada vez mais curiosa.

- Sabia que talvez a gente já tenha feito isso?

- Isso o que?

- Vou precisar de uma forma de provar para você.

- Provar o que?

Chegando no quarto, Gustavo tirou da sacola plástica uma geringonça tecnológica que mais parecia aqueles rádios valvulados da primeira metade do século XX, sem a caixa de madeira que os envolvia. Via-se fusíveis e transistores antiquados, tendo um relógio analógico de ponteiros dourados no canto esquerdo e um calendário digital no direito. Colocou a traquitana sobre a cama e apreciou-a como se fosse uma verdadeira preciosidade.

- O que é isso?

- Para de fazer perguntas, Julia, você tá me deixando confuso.

- Eu é que tô confusa!

Com as mãos na cintura, apreciou o quarto todo como se fosse um cineasta analisando o set de filmagem. Gustavo coçou o queixo e então pegou sua gambiarra tecnológica com uma das mãos e a sacola plástica com a outra, fazendo agora o caminho inverso, voltando a passar pelo corredor e chegando à cozinha, seguido novamente por Julia, ainda equilibrando seu café na caneca alta de corações lilás que ganhara no aniversário. Agora, Gustavo deixava o rudimentar equipamento sobre a mesa e a sacola no chão enquanto abria os armários, tirando deles um pote transparente de pó de café e uma caixa de coadores de papel. Julia, já um tanto impaciente, deixou sua caneca sobre a mesa e observou, quase não se contendo de curiosidade.

- Tem café pronto, acabei de passar.

- Não é isso!

Gustavo foi até a cafeteira elétrica na pia e, aleatoriamente, jogou sobre o coador de papel um punhado de pó com o medidor. Pegou água com a jarra refratária despejando-a em seguida no compartimento da cafeteira. Fechou o topo do recipiente, botou a jarra na base e apertou “on”. Foi até a geringonça sobre a mesa e mexeu nos ponteiros do relógio analógico.

- Olhe para a jarra.

Julia deixou sua caneca sobre o balcão ao lado da pia e aproximou-se da jarra transparente, observando-a com atenção: vazia e com o vapor começando a embaçar o vidro. Gustavo apertou um botão no estranho equipamento sobre a mesa. De súbito, Julia testemunhou, bem diante dos seus olhos, o café instantaneamente pronto e passado, como se em uma fração de segundo toda a água esquentasse, subisse pelo tubo plástico, descesse até o pó, atravessasse o coador e enchesse a jarra, quase transbordando-a. Ela se desinclinou, piscou os olhos e virou-se para Gustavo sem entender.

- Uau. O que aconteceu aqui?

- Julia, nós viajamos no tempo.

Julia deu alguns segundos para seu cérebro processar a informação. Diante da falta de lógica, apenas gargalhou. Um riso nervoso, mais para aliviar o estado de conturbação mental do que para confirmar o hilário da situação.

- Toque na jarra.

Julia foi parando de rir aos poucos e obedeceu ao pedido de Gustavo. Surpreendeu-se mais uma vez.

- Está fria.

- Que horas são agora?

- Umas três...

Gustavo apenas balançou a cabeça negativamente. Assustada, Julia olhou para o relógio de parede decorado com vaquinhas azuis e constatou que eram seis da tarde. Para confirmar, foi instantaneamente até a janela, notando que a luz crepuscular já esticava a sombra de alguns poucos passantes na rua que voltavam do trabalho.

- Gustavo, me explica rápido.

- Já expliquei. A gente viajou no tempo. Fomos para o futuro.

Julia permanecia sem entender. Estava confusa e assustada demais para articular qualquer raciocínio naquele momento. Apenas tentava lembrar da última vez que havia fumado maconha ou se era um deja vu daquela ocasião em que experimentou LSD numa festa.

- Gustavo, pare.

- Julia, é verdade. Eu sei, eu também demorei a me convencer.

- Avançamos quanto no tempo?

- Apenas três horinhas.

Julia olhou para o equipamento sobre a mesa.

- É isso aí?

- É.

- Como é que ela faz essas coisas? Como você conseguiu isso?

- Eu comprei.

- De quem?

- De um vendedor. Na rua.

- Gustavo, pare.

- Sério.

- De onde ele conseguiu isso?

- Não sei.

- Como ele te provou que funciona?

- Que nem eu fiz com você agora. Só que mais simples, ele só me mandou olhar os ponteiros do meu relógio de pulso. Em seguida, eu vi que eles tinham avançado meia hora. E não só o meu, o da torre da igreja também. Na janela da casa da Dona Eulália eu tinha visto que o jornal estava começando na TV, e de repente já estava acabando.

- Tá, mas poderia ser um truque, ele poderia ter hipnotizado você!

- Foi o que eu pensei. Mas daí ele me deu uma prova absoluta. Julia, eu juro, ele programou a máquina para viajarmos ao início do século passado. Eu não conseguia acreditar! Então, entramos no bar que era do meu bisavô! Eu vi o velho, só conhecia por fotos. Esse vendedor então pediu dois refrigerantes. Nós bebemos. Ele pediu outro. Saímos, enquanto meu bisavô esbravejava dizendo que ia chamar a polícia porque nós não pagamos. O tal do vendedor me levou num terreno qualquer, cavou um buraco ao lado de uma mudinha de árvore e colocou a garrafa lá dentro. Daí mexeu nessa máquina de novo. Quando eu vi, nós tínhamos voltado ao presente. Ele me mandou cavar ao lado de uma árvore. Eu fiz isso.

Gustavo então pegou a sacola plástica que deixara no chão, tirando de dentro dela com as mãos trêmulas uma garrafinha de refrigerante toda suja de terra e grama.

- Olha aqui, Julia, a garrafa de refrigerante que ele tinha enterrado há um século!

Julia estava atônita. Gustavo lhe estendeu a garrafa para que ela pegasse, mas Julia se restringiu a olhar assustada para aquela prova suja.

- E quanto você pagou?

- Nada. Ele me disse que eu poderia testar por 24 horas. Dá para acreditar?

- Por 24 horas? Então você nunca mais vai precisar devolver.

- Exato. Porque agora eu tenho, literalmente, todo o tempo do mundo!

Julia ria, mas ainda com a mente entorpecida pelas possibilidades trazidas por aquela estranha novidade sem sentido.

- Tá, e o que vamos fazer? Vamos para a idade média? Ou saber como vai ser o futuro da humanidade? Não, melhor não, dizem que não vai ter água. Ah, eu queria conhecer a Hilda Hilst!

- Julia, você não tá entendendo. Eu tenho um plano muito melhor.

- Qual?

- Vem.

Gustavo jogou o refrigerante barrento na pia e puxou-a pela mão, segurando com a outra todo cuidadoso o artefato que agora era realmente a maior relíquia de sua existência. Passaram pelo corredor, entraram novamente no quarto e fecharam a porta. Sentaram-se na cama, um de frente para o outro, deixando o equipamento sobre o gaveteiro.

- Julia, lembra daquilo que você dizia, que gostaria que seu orgasmo nunca acabasse.

Os olhos de Julia então brilharam e ela ficou boquiaberta ao se dar conta de o que Gustavo tinha em mente.

- Mas isso é possível?

- Claro. Eu só tenho de programar a máquina direito.

- M-mas como assim?

- Preste bem atenção, vou explicar. Eu posso programar esse equipamento como uma máquina fotográfica, daquelas que para sair na foto com os amigos você usa o temporizador, saca?

- Sei.

- Então, eu vou programar para que, dez segundos depois que a gente gozar juntos, ela volte no tempo dez segundos. Então o que acontece? Como ela vai estar programada para voltar no tempo dez segundos num dado horário, ela fará isso para sempre. E nós teremos dez segundos de gozo por toda a eternidade.

- Gustavo, isso é loucura...

- Você não quer viver pra sempre?

- Mas...

- Então imagine viver um orgasmo eterno!

Julia ficou sem palavras diante da situação.

- Julia, nós podemos usar essa máquina de outras formas, para brincar de viajar no tempo e conhecer a pré-história, a revolução francesa, o escambal, só que uma hora poderemos morrer por algum motivo. Mas se fizermos isso que eu estou propondo, seremos eternos. Gozando eternamente! Consegue imaginar o que é isso?

Julia continuava apenas boquiaberta.

- Só que será necessário sermos muito precisos, porque não teremos uma segunda chance. Vamos ter de gozar juntos no momento exato. E eu vou ter de ajustar o cronômetro muito bem ajustado. Você topa?

A resposta de Julia foi um longo beijo. O último longo beijo antes de virarem eternos.

Enquanto Gustavo ajustava o equipamento, cronometrando-o milimetricamente ao mexer no ponteirinho dos segundos para a hora mágica (às 18:30:00 estaria programada para voltar às 18:29:50), Julia já foi tirando suas roupas e deitando na cama, suspirando fundo para se concentrar ao máximo na tarefa que iria desempenhar por todo o sempre.

Gustavo terminou de ajustar a máquina para os dez segundos mais cruciais de sua existência, e então também tirou suas roupas, enquanto Julia afastava a colcha da cama empurrando-a com os pés (18:15:03). Gustavo veio por sobre seu corpo com um olhar de gana e tensão ao mesmo tempo, passando a beijá-la com carinho, inicialmente na testa, nariz e bochechas, lentamente, preparando terreno para um sexo que seria o último, o único e o eterno (18:17:04). Seus beijos se alastraram por todo o corpo de Julia, que foi aos poucos sentindo sua carne íntima se encharcar em fluídos que jamais secariam (18:19:12). Também ela quis retribuir as carícias, num derradeiro sexo oral que fazia do falo de Gustavo uma alusão contemporânea aos minaretes de Clarke e Kubrick no início dos tempos – lamentou não terem colocado música para este momento, mas se houvesse trilha sonora, ela seria “Assim Falou Zaratrusta” (18:21:52). Os dedos de Gustavo agora tateavam o sexo de Julia buscando impregnar suas lembranças com uma memória digital que registrasse a lisa rugosidade daquele relevo irregular, deslizando com a ponta do indicador por cada linha, morro, vale... (18:22:13). Também sua língua desenhou um passeio sinuoso em úmido tributo àquele templo no qual jamais deixaria de prestar louvor, aproveitando para levar ao infinito aquele sabor e aquele aroma que queria tatuados no palato e por dentro das narinas (18:25:02). Sorveu de seus seios um colostro imaginário, e beijou aquele ventre cujo umbigo em breve seria o centro de seu universo, enquanto tinha seu dorso abraçado por coxas tão trêmulas quanto poderosas (18:26:43). Penetrou-a sofregamente, em estocada única e ansiosa, fazendo Julia comprimir sua musculatura cavernosa com gula secular, perjurando com sua carne todos os demais prazeres, os quais nunca atinavam sobre a própria insignificância perante a magnitude do sexo (18:27:01). Avançaram em ritmo e intensidade, cavalgando cada vez mais rapidamente rumo ao clímax, sustentando no semblante um sorriso sutil de quem, inconscientemente, debocha de todos os que trepudiavam sobre a inverossimilidade do “felizes para sempre”, estavam agora marchando em direção ao êxtase, pulsando em euforia ascendente, descompassada e irreversível, em gemidos que ecoariam nos confins dos tempos (18:28:13). O desvario era mútuo, comungavam o frenesi de dois corpos que se aproximavam com acelerada compulsão ao momento que seria repetido por séculos e séculos, multiplicando dez segundos de êxtase a uma equação de tempo incalculável, uma ampulheta de gozo em âmbulas sem fim, um mecanismo agora acionado por uma troca de olhares cujo significado ambos sabiam decifrar como ninguém: estavam à beira do orgasmo universal (18:29:50).

Foi quando entrou no quarto o marido de Julia com um revólver na mão, fazendo Gustavo broxar instantaneamente e a vagina dela se contrair de terror, deixando pairar no ar um breve segundo de silêncio que pareceu um mar de tempo.


- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

- Peguei vocês, seus traíras!

Bang! Bang!

E assim, ad eternum...

Mario Lopes

(Inspirado por Juliana Biancato)

sábado, 22 de maio de 2010

Lá Vem Ela...



De quatro em quatro em anos temos a Copa do Mundo de Futebol. Um mês inteiro de folia, alegria e otras cositas más. As pessoas esperam ansiosamente para ser o técnico, o jogador que perdeu o gol, o juiz que não deu o pênalti, entre tantas outras atribuições futebolísticas. Eu mesma prefiro apenas ser (acredito que muitos também) uma telespectadora que veste a camisa e torce para que o objetivo da história aconteça logo a nosso favor.Mas não é só isso. O clima da Copa traz outras coisas, pois todos se voltam ao mesmo foco e jogam a energia juntos para o mesmo time. Diferente de campeonatos estaduais e o brasileiro, onde a rivalidade é imensa e muitas vezes dá briga feia.Eis inclusive a parte boa, a confraternização. As pessoas se abraçam sem querer saber o time que o outro torce, porque ali, naquele momento, o mote é verde e amarelo, ponto.Seja onde for, na sala de sua casa, na casa de amigos, no bar, na rua, no trabalho, na padaria, na mercearia, no posto de gasolina... enfim, onde tiver uma televisão, certeza, um, dois, três ou mais estarão na frente roendo as unhas, os dedos, suando frio ou rindo pra não chorar.Samba, churrasco, cerveja, amigos, risos e gargalhadas, sair mais cedo do trabalho, mudar a rotina nem que por um dia e só um poquinho, calor humano, simpatia, bom humor. Tudo isso e mais um pouco acontece durante o desenrolar da Copa do Mundo de Futebol que, neste ano, acontecerá na África do Sul. Gente animada.E pra não dizer que não falei das flores... ah, os italianos. Gente bonita. Entre tantas belas pernas desses vários jogadores de várias seleções, os rostos da seleção italiana. Além da emoção que sentimos naturalmente durante a Copa, um pouco de beleza não faz mal a ninguém.Ah, tem também os argentinos. Gente mala. Pode até ser que não sejam, mas no universo copa, se brasileiro não falar mal de argentino, não respeita seu próprio discurso, então: prá lá hermanos.Por fim, os brasileiros, que entre talentos e mistérios... gente que não desiste nunca. E é bom mesmo, porque queremos permanecer mais tempo curtindo tudo de bom que esse tempo de Copa trás, até o último minuto.

Isso aí, a Copa é logo aqui, já é! Enjoy!






Liliana Darolt

sexta-feira, 21 de maio de 2010

O Grande Encontro


Os olhos abriram-se em sincronia com o ritmo de seus sonhos. De uma perseguição mortal e misteriosa, para um quarto escuro e úmido, cheirando a inverno. Lá fora, enquadradas pela janela-moldura, só as pombas resistiam ao tardio despertar do sol e o tempo que embaçava a janela.
Ele ali, aquecido sobre as mantas e pelo sangue quente de atleta que correu por horas a fio. Sempre tivera sonhos demasiados reais, mas nada que umas horas em alerta não entregassem toda a fraude.
Sentia que, lá em sua extremidade, estava sem meias. Sentia o toque dos dedos compridos encostados uns aos outros, buscando um calor que não vinha. Balançavam levemente, de forma quase imperceptível, assim como o vôo dos beija-flores. A pele branca iluminava ainda mais as manchas rochas e esverdeadas espalhadas pelo pé despido.
E o corpo quente. Calçou um par de meias caído sobre o chão e viu o calendário de 2010 jogado ao lado da cama, com o dia 3 de maio circulado com caneta vermelha. Não se moveu por 10 segundos tentando alcançar seus pensamentos, até que enfim, quando já restabelecido do choque, foi a cozinha passar café. O seu pé voltara à cor normal.
“Mas já é hoje? Meu deus, como passou rápido”, pensava ele, colocando a chaleira no fogão. “Não pode ser, alguém teria me avisado. Alguém teria, com certeza. E se eu não tivesse visto o calendário? Perderia tudo, a minha chance. E ninguém me avisou, ninguém. Se bem que devem ter pensado que eu já estava preparado a meses...é, devem ter achado que eu ficaria irritado caso me ligassem”.
A água borbulhava dentro a chaleira.
“Todos devem pensar que passei todo esse tempo treinando. É... mas e se... e se não me ligaram porque não querem que eu vá? E se eles tem medo de mim? Ou será que acham que eu não sou capaz? Impossível!”.
A chaleira balançava sobre o fogão, a água fervia.
“Eles não podem fazer isso. Eu vou acabar com eles, com cada um daqueles imbecis. Quem eles pensam que são. Bando de ... “
Ele acorda com o grito da chaleira que fumegava aborrecida com os pensamentos do amo.
Tentando acalmar-se, ele prepara o café em total silêncio, evitando os pensamentos para agir com astúcia. Não pensaria naquilo o dia todo.
Pronto. Ótima idéia. Iria trabalhar, almoçar, fumar, fazer tudo como o de conforme, e no fim do expediente, comparecia ao lugar marcado como se tudo não passasse de um encontro casual com os amigos com cerveja. Depois iria para casa, dormiria tranqüilo e acordaria na outra manhã com seus pombos e sua chaleira.
Durante a manhã, derrubou café cinco vezes em sua roupa, levantou da cadeira para ir fumar pelo menos 20 vezes, das quais 17 desistiu, repreendido pelo olhar do chefe. Sua camisa branca ficou encharcada em suor, o cabelo besuntado em sujeira de tanto ele passar a mão na cabeça.
Durante o almoço, aproveitou que o escritório ficava vazio para estudar suas estratégias e movimentos. Teria que se precaver, antecipar suas ações, ser discreto, ou senão seria um desastre. Perderia tudo, afinal, poderia até ter esquecido da reunião, mas foi uma falha única. Vivia para aquilo. Era seu alimento, sua razão.
Elaborou esquemas até não conseguir mais mexer as mãos, esperando ansiosamente a hora de ir embora.
Ficou esperando que algum deles lhe telefonasse, mas nada aconteceu. Provavelmente, eles estavam tentando ser discretos. O que tinham em mãos era um segredo que jamais fora ou seria revelado.
18 horas. Fim do expediente, hora de bater o cartão e ir embora. Mal passou pela porta, já arrancou a gravata e tirou a camisa de dentro da calça. Faltavam menos de 30 minutos para a decisão.
Tinha que estar relaxado pra quando chegasse a hora.
Porém, por mais que tentasse, não conseguia manter a concentração. O suor escorria incessantemente por seu pescoço e suas mãos tremiam tanto que ele demorou 2 minutos para colocar a chave do carro na ignição.
Deu a partida, abriu todos os vidros, e tratou de respirar lentamente. Ainda teria 40 km para se estabelecer. Precisava oxigenar o cérebro.
A fumaça paira sobre o ambiente escuro. Vultos vestidos de preto estão sentados ao redor de uma enorme mesa redonda e quase a fazem vibrar com tanta tensão. Ali, parece proibido o contato olho a olho. O silêncio só é quebrado no momento exato em que cada um deve falar.
Atento a tudo, relembrando suas estratégias, ele anseia a hora de falar. Olha para todos os presentes, e tem vontade de pegar um a um pela gola da camisa, colocá-los contra a parede, até admitirem a verdade. Tinha certeza de que não mantinham aquele segredo a salvo.
Pensando no que aconteceria se sua mãe um dia descobrisse sobre tudo, quase ele perde sua chance de falar, mas ágil como era, ele levanta da cadeira e grita:
- SUUUUUUUUUUUPER TRUNFO!
Embaraçado, ele senta-se novamente, pega as cartas na mesa, e volta a suar.





Letícia Mueller

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Pra Falar A Verdade, Às Vezes Eu Minto


Uma das perguntas que passam pela minha mente, quase diariamente vem do desenho Alice no País das Maravilhas ( aquele da Disney, nada das mega produções atuais ) onde uma lagartixa bem zen, apreciadora de um narguile bem louco, pergunta:

- Quem és tu?

E a resposta vem, em geral, de acordo com algo que você precisa resolver, ou de acordo com o modo que você pensa, ou simplesmente do modo como você ACHA que pensa.

Vou tentar me fazer entender:

Diálogo I – Povão em geral

- Mas é uma vergonha isso aí. Olha só se tem cabimento, Zé. Cada dia descobrem um político novo metido em falcatrua. São uns ladrões mesmo, onde é que a gente vai parar pagando imposto que financia a mordomia desses palhaços? Na TV não se fala em outra coisa.
- Pois é. O que mais falta a gente ver né? Opa, o telefone ta tocando, pode deixar que eu atendo, Lourdinha.
- Ah, amor. Obrigada, você sim é um homem decente.
- Ô, Lourdes, ligação pra você.
- Pra mim? Quem é?
- Ah, disseram que é daquele serviço que você pediu pra ligar os fios da antena de cabo do vizinho aqui em casa.

Diálogo II – Socialite engajada

- Ai, eu acho o fim esse preconceito com as pessoas que tem opção sexual diversificada. Acho que cada um faz o que quer, ué.
- É mesmo né, amiga. Imagine só que falta de classe, ficar apontando as pessoas como se fossem bichos. Meu cabeleireiro mesmo, é uma criatura divertidíssima, maravilhosa, alto astral, tudo de bom.
- Eu mesma tenho uma amiga que depois de se separar, acabou optando por um relacionamento homossexual e hoje é muito mais feliz, inclusive com aprovação dos filhos. Bárbaro né?
- Sim. Espera um minutinho, vou ver porque a Caroline está demorando tanto pra se arrumar. Ah, ali vem ela. Minha filha, onde você pensa que vai com essas roupas?
- Eu vou com vocês no salão, mãe.
- Mas de jeito nenhum. Troca já isso. Ta parecendo um menino com essas calças largas. Quer que as minhas amigas achem que é lésbica? Vamos, vamos, estou esperando.

Diálogo III – Caipira esperto

- Manoel, que ocê acha desse negócio de gente que pula cerca?
- Eu acho mais que normal, uai. Acho que se traiu é porque o companheiro pode ter dado motivo.
- Que motivo ocê acha que teria? Muié, por exemplo, que motivo?
- Elas tem vários. Vivem inventando umas dor. Despois num querem que o marido vá buscar arguma diversão fora de casa. Normal, pra mim é normal. Eu mesmo iria ser esperto e dar meus pulo.
- I si fosse tua muié que traísse ocê?
- Deus o livre, eu matava ela e o cabra junto. Magina que muié minha vai traí. Casamo na igreja, cas bênção de Deus, inté parece...

Isso te lembra alguma coisa? E tem gente que ainda acredita...


Angelica Carvalho

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Hoje é dia de estreia no blog. Juliana Biancato é apresentadora do programa Where TV, exibido na Band paranaense às 10h30, aos sábados. É atriz, modelo e matriz da simpatia absoluta. Essa aquariana (signo vocacionado para o carisma) é também poeta, embora se defina como uma “escrevinhadora”. Seja lá o que isso signifique, ela manda muito bem no que escreve, possivelmente porque sabe sorver a vida com intensidade, como pode ser percebido no texto abaixo. Bem-vinda, Juliana.

Choro E Gozo


Era sempre quando estava sozinha. Ela já sabia. Opa! Era o momento que iria chorar.
“Ele vai sair e ele não vem mais, ele só volta à noite e ele não responde mais, ele foi tomar banho e ele não liga mais, ele foi trabalhar e ele não me quer mais”.
Foi então entendeu que poderia chorar a qualquer momento. “Sou atriz, posso chorar!”
E chorava.
Mas chorava de verdade daquela dor doída, doida, que vem assim como fome que corrói o estômago.
E chorava... E lhe queriam satisfações e ela então dizia: “São exercícios”. “Estou criando uma personagem”. “Estou estudando uma personagem”. “Estou ensaiando uma personagem”. “É minha personagem”.
Mas sentia! Ah, como sentia.
“Como podem dizer que eu sou uma boa atriz, se é tudo verdade?! o que sabem eles de interpretar? O que sei eu? Nunca interpretei... não existe interpretação, isso quem inventou foi alguém que também sentia demais e precisava muito compartilhar com a atenção das pessoas dispostas a sentirem também.”
Nunca interpretou. Sempre fora ela que, dentre todas elas que tinha dentro dela, queria vir à superfície e viver um pouco. Mesmo se essa vida fosse só dor. Dor de saudade, de autopiedade, de amor, de amar, de ter dó do mundo, de ser mãe, de culpa, de culpar... De viver, de querer, de querer viver, de bem querer!
Mas essa era realmente ela? E aquela outra ela? Aquela que ri muito, que faz piadas, que faz graça, que é uma graça, que é linda e que todos amam! Essa interpreta as vezes que julga necessário interpretar para si mesma. “Mas qual é o problema de interpretar? Sou atriz, eu interpreto”. Essa outra ela quer ser ela a maior parte do tempo. Será que não era ela mesma essa ela?
Das outras elas ela já não lembrava mais, já nem se importava que não fossem mais ela as outras elas. Foram coadjuvantes. Elenco de apoio, para suportar e fazer escada para o ego dela que também tinha os seus caprichos.
Mas essas duas elas a dividiam partindo-a ao meio entre culpa e prazer... Entre choro e gozo. Entre dor e riso. Entre saudade e novidade. Entre paz e peso.
E ela amava as duas! E foi aí que as duas se tornaram uma.
Tornaram-se Ela.


Juliana Biancato

terça-feira, 18 de maio de 2010

Sonho Animal


Frequentemente vejo a mesma cena. Estavam lá, perdidos. De repente, mais um. E mais um e mais outro e mais tantos. Línguas para fora, orelhas em pé. Fico me perguntando...e se fossem humanos? No fundo, sei a resposta.
Hoje vivo a sociedade de muitas coisas. Da informação, da tecnologia, da perdição, da transformação, da revelação. Uma sociedade que prioriza somente o ego, mas que se for para preservar alguma outra forma de vida que não a sua, tem que ser humana. O homem é assim. Só mantém (quase nunca) cuidado com aquele que lhe parece. E os outros....ah!Que fiquem perdidos, que sirvam de cobaia ou alimento.
Aí, eu me pergunto novamente...a quem devemos realmente cuidar e quem não devemos?
Vivemos na sociedade em que o homem não liga mais para os animais que ele insiste em considerar irracional.
Só porque ele não fala?Pois muitas vezes entre humanos o silêncio e as ações é o que deveríamos mais fazer, é o que mais falta.
Só porque o homem acha que ele não pensa?Pois o homem sim se mostra um ser não pensante quando supõe que animais não pensam. Tanto pensam que nossos cães de estimação sempre se lembram de seus nomes, de onde dormem, rejeitam o que não gostam e aceitam o que lhes convém.
Por que eles não são como nós?Pois eu preferiria ter a beleza de uma onça pintada a ser somente um corpo como outros tantos bilhões que existem por aí.

O homem precisa entender que aquele cão da esquina e o leão lá da selva é igual à ele. Sentem, vivem, pensam (como os macacos têm demonstrado fielmente aos cientistas o quanto são capazes de fazer cálculos e que possuem memória ávida). O homem precisa parar de julgar aqueles que defendem a natureza como meros ambientalistas que tentam mudar o mundo. O mundo não é somente aquilo que atinge a todos. Se cada um fizesse a sua parte, o mundo de cada um poderia ficar melhor. Mas ninguém faz. Acham que sonhar demais faz mal, é ilusão. E por causa dos que não sonham, todos nós vivemos no pesadelo.


Bianca Nascimento

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Semana de tema livre

A Grande Paixão



- Boa tarde, doutora. Como está a senhora?
- Estou bem. Sente-se e fique à vontade.
- Obrigado.
- Por favor, fale-me um pouco do senhor. Qual sua profissão, como é sua família e por que me procurou.
- Pois não: sou fabricante de calçados, meus negócios vão bem, graças a Deus; sou casado há 35 anos e tenho um casal de filhos. Minha mulher faz trabalho voluntário na comunidade, meu filho está casado há 3 anos, minha filha está noiva e estes dias foi assaltada, o que nos abalou muito. A cidade está do jeito que está. O mundo está do jeito que está, e na televisão e jornais, a senhora sabe como é, ainda ficam dando “idéias”. As pessoas perderam o limite.

Ele era bem alinhado, vestia-se com bom gosto e discrição e a calvície que já iniciara, não tirava seu charme. Figura conhecida e respeitada na cidade, era integrante da sociedade local e estava sempre na mídia. Chegou constrangido ao consultório e sentia-se pouco à vontade em falar de si mesmo. Mas explicou à terapeuta que estava ali, porque precisava da sua ajuda para se separar.

- Mas o senhor acabou de me dizer que é casado há 35 anos.
- Sim, doutora. Não é de minha esposa que quero me separar. É que estou apaixonado. Apaixonado por uma moça muito mais nova que eu. Ela me devolveu a alegria de viver, a vitalidade, recuperei a energia que há tempos não tinha. É dela que quero me separar.
- Mas por quê? Se o senhor está apaixonado, não seria este o caso, de o senhor viver esta paixão? O senhor não se dá bem com sua esposa?
- Sim, doutora. Muito bem. Minha esposa é uma companheira maravilhosa e foi uma mãe de família exemplar durante todos estes anos. Ainda nos damos bem em “tudo”, se é que a senhora me entende.
- Entendo, sim.
- Então... Preciso da sua ajuda para me separar desta moça, desta nova paixão. Amo minha família e não posso admitir uma atitude como esta: de vida dupla, mentira e traição. Não posso, doutora.

Ele estava sofrendo. Sofria porque tinha princípios e valores e não admitia estar ferindo-os. Infelizmente, a paixão pela moça mais nova aconteceu de uma forma inusitada e sem controle, ele não conseguiu evitar. Mas estava sofrendo porque tinha que dividir sua atenção, seu carinho, sua vida. Estava com a família e pensava nesta moça, queria estar com ela, viver esta paixão. Estava com a moça e pensava na família, no quão canalha estava sendo com sua grande companheira e com seus filhos, que o respeitavam e o idolatravam.

- As coisas estão ficando sem limite, doutora. Por favor, me ajude.

Iniciaram então, a terapia que levou 1 ano. Aos poucos ele foi organizando as idéias, fortalecendo-se para tomar as atitudes que achava serem necessárias e tomando o devido cuidado para que sua família jamais descobrisse sobre esta moça que entrara na sua vida. Separou-se aos poucos desta moça, que foi se afastando em silêncio, sem entender a atitude dele e sem nunca imaginar o quanto ele sofria por esta ruptura, o quanto ele a amava.

Durante este período, fez uma viagem de negócios em função de um novo projeto profissional e só voltou à terapia, após dois meses.

- Vejo que o senhor está muito bem! Rejuvenesceu, está com a aparência mais leve, mais iluminada, perdeu peso.
- Sim, doutora. Estou muito envolvido neste novo projeto de internacionalização da minha empresa, voltei a jogar tênis e estou fazendo yôg. E....Bem, estou apaixonado por uma nova mulher. Perdidamente apaixonado.
- Mesmo? Mas depois de toda a dor que o senhor sentiu e sofrimento pelo qual passou para se separar daquela moça?
- Sim, senhora. Mas desta mulher não vou precisar me separar.
- É mesmo?
- Mesmo doutora. Para ela vou dedicar o resto dos dias da minha vida, para ela vou dar meu coração por inteiro.
- E ela é também muito mais nova que o senhor?
- Sim, senhora. Tem 2 meses de idade. Meu filho me deu uma linda neta e em minha homenagem, deu meu nome em versão feminina, a ela.


Karime Abrão

domingo, 16 de maio de 2010

Aroldo E Sua Diva


- Manoela minha diva, o que temos para o jantar de hoje?
- Manoela não Aroldo: Lady Malu! Respeite-me porque uma vez diva sempre diva.
Manoela ou Lady Malu, é uma mulher já de certa idade, na sua juventude havia feito bastante sucesso nas radio novelas e nos palcos de teatro do Rio de Janeiro, havia saído em turnê por todo o Brasil com algumas peças, com outras até despontou na Europa. Mas tudo aquilo foi há 40 e poucos anos, o nome artístico claro: Lady Malu. Não teve filhos, a dedicação pela arte lhe exigiu muito, o tempo não sobrou para a maternidade tampouco para manter algum de seus seis ou sete casamentos.
- Pois bem Lady Malu, o que temos para o jantar de hoje?
- É... Pois é... Então, acabei não fazendo nada porque você Aroldo esta um balofa desse jeito não haverá roupa que caiba em você. E eu como uma diva que sou não posso me dar ao luxo de comer depois das 18 horas, melhor mesmo é fazermos um jejum.
Aroldo seu fiel mordomo desde os velhos e bons tempos, hoje um companheiro para dividir a quitinete de subúrbio, sabia que Lady Malu era orgulhosa demais para admitir que ele deixara a muito de ser o seu mordomo, sabia também que jejum a noite nunca foi agradável para a diva, mas ela jamais admitiria que seus 500 e alguns reais fossem pouco demais para garantir o jantar do mês inteiro quando se tem que pagar o aluguel, condomínio, luz e água.
Mas a amizade a admiração pela Lady foram tantas ao longo de todos estes anos que Aroldo seria incapaz de desafiá-la tampouco deixá-la a deriva.
- Você tem toda a razão minha diva, vou aproveitar para dar uma volta no calçadão, até mais.
- Até mais Aroldo, ficarei aqui tratando minha beleza no silêncio e no escuro.
- Seu Manoel, por favor, o de sempre, o meu agora e outro para viagem.
- Pois é pra já Aroldinho!
E Aroldo como em todas as noites repetia, foi até o boteco da esquina e com os poucos tostões que lhe sobrara - já que sua aposentadoria era um tanto maior que de Manoela pois Aroldo na juventude poupara seu salário e Lady havia sido generosa enquanto podia com seu salário, enquanto ela mesmo torrou tudo em produtos de moda e beleza – comprou dois sanduíches completos e uma garrafa de suco. Comia o seu no boteco e levava outro sanduíche e meia garrafa de suco para Lady Malu, que saciava sua fome pela noite, as escondidas de Aroldo, como se aquele ritual fosse uma verdade velada entre eles.
Esses rituais ocorreram por anos, mas Lady Malu nunca conseguiu admitir que dependesse de Aroldo por tantos anos e pior ainda, que a fama, o glamour e o sucesso a abandonaram há bastante tempo...
Aroldo, no entanto guardava um respeito e admiração enormes pela diva que aos seus olhos jamais deixara de ser uma diva, afinal foi ela quem acreditou em Aroldo quando a família o abandonou, quando estava entregue ao alcoolismo. Não foi Lady Malu, mas a amiga Manoela quem lhe estendeu a mão, pagou seu tratamento, lhe deu um emprego de mordomo com altíssimo salário para a época e lhe carregou para todos os lugares do mundo permitindo a Aroldo oportunidades que a vida jamais lhe proporcionaria.
Por essas e por outras se fez uma grande amizade, recíproca e verdadeira, ele ajudava ela e ela o ajudava, até o fim assim seria, eram a família um do outro. Juntos descobriram que viver para a arte é sempre uma arte.



Fernanda Bugai

sábado, 15 de maio de 2010

Língua


É da língua que eu sinto falta

Do rosto,

do toque,

do resto,

da pele


Que não repele gostar do gosto do gozo

Sinto falta do cadeado que o corpo simula

Durante o abraço encadeado

Que agora, como lembrança...

Retorna,

Quando pico-me as dores

Metamorfoseado em veneno guardado

A recordação dessa tal prisão braçal.


Em tons fugindo das cores

Tento compreender minha aquarela

Que finge amores

Fez-me infringir minhas próprias leis

E romper com os meus valores


Derreto-me a memória dos sorrisos

Tão tricolores

Mas que sendo seus,

Nunca terminam indolores.



Jéssica Ferreira

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Personalidade Nominal



Chamava-se Guilhermina. Já começara bem a sua vida. Desde que se conhece por gente, ela é ridicularizada pelo nome masculinizado. De nada adiantava que o pessoal de sua casa lhe enchesse de elogios se porta afora era vista como uma sapatão, uma andrógina estranha e truculenta. Tudo por causa do nome.
Guilhermina passava horas no espelho examinando sua aparência, desde os fios de cabelo, até a pele do pé. Tentava achar algo bonito, ou feio, alguma coisa que se destacasse naquele grande bloco de pele, osso e gordura.
Tudo nela era tão normal que chegava a dar sono.
Não era nem magra, nem gorda, nem gordinha, magrinha, nem nada. Não tinha um corpo bonito, que se pudesse dizer bem feito, mas também não o tinha horroroso, que chamasse a atenção. Tinha formas que de tão indefiníveis, pareciam repelir os olhares preguiçosos evitando incessantemente qualquer coisa que lhes aborrecesse com sem gracisse.
Guilhermina buscava dentro dos seus olhos um toque de diferente, mas para combinar com seu conjunto nude, não via mais nada além de dois buracos pintados de marrom escuro. O formato também deixava a desejar, sendo realmente semelhante a duas escavaçõezinhas feitas no rostinho invisível.
Alguns poderiam até dar graças a Deus que os olhos não chamavam a atenção, pois se do contrário, pareceriam fantasmas flutuando no ar.
E isso não se dava pelo tom de sua pele, dos cabelos, dos lábios, ou qualquer coisa que o valha, mas pela ornamentação dos elementos que compunham Guilhermina, tão sem forma, quase maleável, tipo massinha de argila, tirando a parte da diversão.
Ela era assim, sem graça, sem cor, sem vida. Um objeto andante que falava, ouvia e sentia, sem ser ouvida ou notada. Vivia sem existir.
Mas, ela tinha os seus momentos de glória. Depois de passar anos e anos examinando-se no espelho sem nada ver, Guilhermina notou que ser andrógina e esdrúxula era uma característica atribuída única e exclusivamente ao seu nome, e não sua aparência.
Era como se a visão que o mundo tinha dela fosse um espelho do que representava o tal nome Guilhermina, e nada mais do que isso. Um nome ultrapassado, antiquado e masculino. Um nome prepotente, por achar que basta acrescentar 3 letras para se tornar o nome de uma donzela. Um afronta aos delicados e femininos nomes normais que se usam por aí.
Mas, esse nome era ela, e Guilhermina sabia disso. Sabia que era sua chance de aparecer no mundo, de parecer alguém, de se sobressair em meio a multidão, por mais, é óbvio, que ainda existissem outras tantas homônimas a ela.
Pelo menos, quando lhe perguntavam como se chamava e ela respondia, conseguia tirar alguma expressão do rosto das pessoas. E assim, tinha seu momento de felicidade.
Chegou até a pensar em criar um crachá para usar na rua, e exibir em letras garrafais bem chamativas todas as letras do seu nome G-U-I-L-H-E-R-M-I-N-A.
Mas pensou que talvez fosse mal interpretada, e nunca o fez.
Cada vez mais incorporada em si mesma, ela descobriu uma rainha xará, grande negociante e persistente em suas negociações. Leu a respeito, e ficou espantada com tantas semelhanças.
Assim como ela, a rainha mantinha um bom relacionamento com os pais (apesar dos pesares), era de forte personalidade, agindo e falando de acordo com seus pensamentos, sem censura, e era dotada de um grande espírito empreendedor.
Gostou, pesquisou, e acabou viciada nas literaturas que tratavam do assunto. Lia livros e mais livros sobre a rainha, sobre suas vestimentas, suas manias, suas estratégias, seus penteados, seus amigos, família, conhecidos, sobre tudo.
Cada vez que lia uma nova obra, inconscientemente, roubava um pedacinho para si e transformava-o em parte de sua personalidade.
Costurava vestidos estranhos, prendia os cabelos em formas complicadas, andava de cabeça erguida, peito estufado, toda impecável.
Tornava-se, aos poucos, a verdadeira Guilhermina, e fazia jus ao nome imponente que tinha.
Seus novos hábitos até lhe garantiram olhares na rua. Passou a chamar a atenção sem ter que abrir a boca, apenas passeando por qualquer lugar onde houvesse pessoas.
Aliás, era até raro alguém que não prendesse o olhar na figura que Guilhermina virava. Alguns disfarçavam, embaraçados com a presença, outros nem tão discretos, quebravam o pescoço para observá-la.
O ápice ocorreu quando, em plena rua XV, repleta de pessoas de todos os tipos, um artista de rua pediu para retratá-la em desenho de grafite.
Era o seu momento. Guilhermina, extasiada, aprendeu a viver, e sabia que assim como a sua rainha, estaria para sempre imortalizada em uma obra de arte.




Letícia Mueller

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Arrisque-se Ou Esquece-te


"... e nós somos os atores dessa peça, cada um desempenhando um papel!"
Este foi o final da frase que ouvi hoje à tarde, depois de ter uma conversa com um bom amigo. E como bons amigos que fazem parte da nossa vida, ele me colocou a refletir e por isso tenho que agradecer aqui a ele por mais esse “insight”.

Se a vida fosse uma arte qual delas seria?

Eu poderia pensar no circo, primeiramente, sempre o circo, onde passaríamos por malabaristas ou mágicos driblando as dificuldades, por bailarinas dançando ao som da música suave e cheia de alegria, por palhaços sendo enganados por uma sociedade medíocre. Então, quando cheguei nesta parte, achei que deveria mudar.

Então pensei numa tela, com uma linda paisagem sendo pintada um pouco a cada dia. Primeiro os traços, depois as cores verdes das matas, misturado com um marrom claro de estrada e pequenas pinceladas nas cores das flores. Árvores surgiriam, um céu iluminado pelas cores do sol, e lá no cantinho uma casinha simples tomaria forma com um casal sentadinho num banco do lado de fora. Então pensei que o pintor se cansaria de sua obra tão Bauermalereiana* e de uma hora pra outra mancharia tudo com outras novas cores e estilos transformando sua obra em um abstrato incompreensível. Quando cheguei nesta parte, achei que deveria mudar.

Claro, a dança. Cada vida um estilo, cada alma uma forma de condução. Tango para os mais ousados, bolero para os mais conservadores, dança moderna aos alternativos, funk pra galera do morro, rock pra mim. Em cada música uma emoção, em cada refrão uma crença, de dia, de noite, cada momento com um tema específico. A vida cantada e dançada em todas as suas formas, rodopia, rodopia, rodopia, deixa tonto, fora do ar, até que vira o pé e se machuca. Foi aí, nesta parte, que achei que deveria mudar.

Cinema, teatro, interpretação, afinal somos atores todo o tempo. Quantas vezes sorrimos sem ter vontade, choramos de saudade, encaramos guerras, tragédias e comédias, deprimimos, damos a volta por cima, amamos, esquecemos, trabalhamos, suamos, transamos, temos filhos, cachorros, gatos, viajamos, conhecemos pessoas, estudamos, crescemos, envelhecemos, sonhamos, encaramos, caímos, quebramos, ganhamos dinheiro, compramos, perdemos, gargalhamos com amigos, com família ou sozinhos mesmo... sozinhos... e nesta parte eu entendi que não deveria mudar. Não deveria mudar, mas sim, encarar.

Nesta parte, eu entendi que a nossa vida é uma arte que nos pertence e que nós, somente nós, a criamos, damos forma, riscamos, rabiscamos, montamos e destruímos. Que cabe somente a nós o nosso destino, os nossos objetivos, as nossas glórias, como também cabe a nós optar pela vitória ou pela derrota. Cabe a nós encontrar dentro de nós mesmos o que nos impulsiona nessa vida, mesmo que nos percamos muitas vezes no meio dessa loucura que as pessoas insistem em nos fazer engolir. Entendi que a sociedade dos homens nos força a agir longe da espiritualidade que levamos anos para desenvolver e que poderemos levar outros tantos anos para recuperar. A arte da vida é esta. Encarar os momentos em todas as suas cores e dores. Se não houver luta, não haverá o que conquistar. E se tem uma coisa que já vivi foi a felicidade do merecimento por um obstáculo vencido. Isso sim, é viver. Viver é uma arte que mistura todas as artes.

Mas, se ainda assim eu continuasse a procurar pela arte que ilustraria a vida, escolheria então a poesia e, parafrasearia Vinícius de Moraes, que dizia:
"A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida..."



* Bauermalerei - (Bauer = fazenda, malerei = pintura) O Bauermalerei teve sua origem entre os Alpes bávaro e austríaco e é frequentemente chamado de Pintura Alemã ou Pintura Bávara. O Bauermalerei é dividido em vários estilos, distinguidos uns dos outros por características como traços, cores e riscos específicos. A pintura é feita com cores alegres e retratando principalmente flores, mas também frutas, pássaros, paisagens e figuras humanas, usando-se pinceladas ensaiadas (C, S e vírgulas), feitas com pincéis redondos.

“A arte da vida consiste em fazer da vida uma obra de arte.”(Mahatma Gandhi)

“A arte é a auto-expressão lutando para ser absoluta.”(Fernando Pessoa)

“A arte diz o indizível; exprime o inexprimível, traduz o intraduzível.”(Leonardo da Vinci)



Angelica Carvalho

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Elisa e a Arte de Viver


Elisa tinha cinco anos de idade e era uma menina muito sapeca. Um certo dia sua mãe, dona Úrsula, saiu de casa e a garota abriu sozinha uma lata de creme, que caiu no chão. Sua mãe, quando voltou, viu a travessura e gritou:
- Fazendo arte, de novo!
A criança assustada saiu correndo para o quarto da sua avó, dona Sofia, e perguntou-lhe:
- Vovó, o que é Arte?
A idosa respondeu:
- Arte é a capacidade que o ser humano tem de transformar coisas simples em obras inesquecíveis. Exemplos: um músico faz as notas musicais virarem uma bela canção, o pintor escolhe as tintas para fazer um quadro e a costureira pega um pedaço de pano e consegue montar uma roupa.
Então, Elisa comentou:
- Isto parece mágica.
A velhinha explicou:
- Sim, isto é uma mágica chamada criatividade.
Deste jeito, a menina disse:
- Hoje eu derrubei uma lata de creme no chão e a mamãe gritou que eu estava fazendo Arte.
- Derrubar coisas é Arte?
Sofia falou:
- O que você fez foi uma simples travessura. Muitas pessoas usam o termo Arte, no sentido pejorativo, para designar traquinagens. Porém esta definição errada de Arte deu-se numa época em que os artistas eram vistos com preconceito pela sociedade, como se eles fossem vagabundos.
Naquele instante Pedro, o pai de Elisa, entrou no quarto e gritou:
- Vocês estão falando de Arte?!
- Não quero que você vire artista, Elisa!
- E quanto a senhora, mamãe, ninguém pode saber daquele segredo!
Depois desta bronca a saiu chorando para o quarto. Quando ela completou sete anos, dona Sofia colocou a neta para fazer aulas de balé às escondidas. A idosa também comprou um violão e dava tintas coloridas, para a garota, sem que seu pai percebesse. Um certo dia, quando Elisa já estava com doze anos de idade, Pedro avisou que passaria uma semana fora de casa, pois viajaria a serviço. Desta maneira, num sábado sem a presença de Pedro, dona Sofia teve a idéia de fazer um sarau com os artistas da cidade em sua residência. Assim a idosa telefonou para eles e foi uma grande festa, pois havia vários artistas: bailarinos, músicos, atores, pintores, costureiros e escritores. Porém no meio do baile, de supetão, Pedro apareceu e gritou:
- Que bagunça é esta em minha moradia?!
Deste jeito ele apontou para Sofia e berrou:
- Aposto que esta balbúrdia é invenção sua, mamãe!
- O que vocês estão olhando?!
- Saiam todos da minha casa, ou, eu chamarei a polícia!
Então a anciã foi para o quarto chorar. Então Elisa entrou no quarto da avó e se surpreendeu quando viu fotos antigas, de uma vedete, em cima da cama. Assim a adolescente perguntou:
- A dançarina da foto é a senhora, vovó?
Sofia respondeu:
- Sim. Pois eu fui dançarina de teatro de revista. Além de dançar, eu cantava, representava e fotografava.
Após dizer estas palavras, a velhinha caiu morta no chão. No dia do velório da anciã, Elisa leu a seguinte poesia que fez em homenagem a avó:
“Minha Arte é Viver

Minha arte é viver...
Ela está acima do prazer!
Eu pinto todos os pensamentos...
Com as cores dos sentimentos!

Faço música com as vozes...
Dos seres mais ferozes!
Com os sons da natureza...
Na sinfonia da beleza!

Eu danço pelo divino ar...
Para não se acomodar...
Aqui, ou, em qualquer lugar!

Vovó, fui eu quem costurou sua mortalha...
Com o tecido suave e eterno da sabedoria...
Porque a criatividade nunca falha...
Para quem deseja expulsar a agonia!

Minha arte é viver...
Não há morte, só anoitecer.”

Após declamar esta poesia, a menina foi aplaudida e colocou uma rosa vermelha no túmulo de sua avó.



Luciana do Rocio Mallon

terça-feira, 11 de maio de 2010

Resposta?


“O abrir de olhos é um martírio. É o que menos queria fazer no dia. “Não devia ter acordado hoje!”. É o que se diz. Depressão do fim de semana: crise de final de tarde, de segunda de manhã. Essa semana que vai vir...será que vou aguentar?
Ter que trabalhar. Ouvir, cumprir ordens. E o tempo para nós vai ficando para depois, para as férias. E quando elas chegam, só queremos dormir...e sonhar com lugares e viagens para onde desejamos ir.
Amar e ser amado...tão difícil. Melhor deixar para amanhã. Por enquanto só gostar já ta bom.É assim o que dá certo. Essa coisa de amor sei lá. Até achar alguém, até alguém me achar. Até cruzarmos os caminhos, sentirmos um tremelique, uma paixão, um amor. Darmos os primeiros passos, os segundos, e iniciar a relação. Não, não. Às vezes não tenho tempo nem de olhar para o lado.
Santo Deus!Viver é tão complicado, difícil, estranho, monótono, previsível. Por que então?”
Infelizmente, este pensamento até a última interrogação é o que passa ou já passou no pensamento da grande maioria das pessoas. E é na interrogação que se para e se pergunta: para que viver?
Não adianta fazer uma lista de como viver bem. Não há fórmulas para isso. Não ponha sua felicidade lá em cima, em coisas ou situações. Não adianta olhar para a vida alheia. A vida não é feita de uma lista de como se vivê-la para estar ou feliz. A vida é feita de interrogações. E as respostas?Só vivendo para saber.



Bianca Nascimento

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Tema da semana: Viver É Uma Arte

A Arte De Viver Bem No Trabalho

É no trabalho que passamos a maior parte do nosso tempo e é com nossos colegas que dividimos a maior parte dos nossos dias. Passamos mais tempo em nosso local de trabalho, do que em nossas casas, com nossas famílias e amigos.
Aliás, é no trabalho que muitas vezes, surgem grandes amizades.
É através do trabalho que aumentamos nossa network, que conhecemos novas pessoas, que temos novas oportunidades de crescimento.
É por isso, que além de cuidar da relação com nossos familiares e amigos, temos que aprender a valorizar e a cuidar do relacionamento com nossos colegas de trabalho; temos que aprender a respeitar as diferenças individuais e a desenvolver a política da boa vizinhança.
Em época de reestruturação nas organizações (o chamado e temido downsizing), pequenas atitudes podem ser seu grande diferencial como profissional, tornando sua vida e a de seus colegas, mais fácil.
A seguir, estão algumas dicas para tornar o convívio com seus colegas de trabalho, mais prazeroso. Faça bom uso delas!

1 – Seja educado e gentil com seus colegas, porém, evite conversas sobre assuntos pessoais. Não podemos deixar a vida pessoal interferir na profissional e, vice-versa. Se seu papagaio de estimação estiver doente, procure o veterinário, providencie o que for necessário para que o bichinho fique bem e que sua recuperação seja tranqüila, mas vá trabalhar.
2 – Cuide de sua vida e seja responsável por suas tarefas, desempenhando sua função sempre da melhor forma possível. Evite a interferência na tarefa de seu colega, mas ofereça ajuda ou ajude-o, quando solicitado.
3 – Seja flexível e escute o que seu colega tem a lhe dizer. Quando ouvir uma crítica (desde que construtiva), não leve para o lado pessoal e procure analisar o que o outro está lhe dizendo, para que você possa aprimorar seus pontos fracos. Se for um assunto delicado, sugira abordar este assunto em uma reunião.
4 – Evite brincadeiras de mau gosto. Ser uma pessoa simpática e querida por todos, não significa ser inconveniente fazendo brincadeiras o tempo inteiro ou dando alfinetadas sarcásticas em seus colegas, achincalhando suas roupas, penteado, etc. Se o colega estiver com um acessório, roupa ou penteado de cabelo que não seja apropriada à função, cabe ao chefe chamar a atenção de seu funcionário, e orientá-lo.
5 – Evite envolver-se em fofocas e boatos. Se algum colega vier lhe contar alguma coisa, diga gentilmente, que prefere não envolver-se com este assunto e mude o rumo da conversa para algo mais agradável. Se, durante o almoço com os colegas, fizerem perguntas indiscretas, use a técnica do sal: “Me passa o sal, por favor ?” e faça uma cara de “lâmpada”. Normalmente, o assunto acaba aí. Descontraia.
6 – Nunca puxe o tapete dos outros, falando mal de colegas ou apontando erros. O prejudicado pode ser você.
7 – Quando cometer um erro ou grosseria, peça desculpas. Evite a inveja, cobiça e arrogância. Se tiver problemas de relacionamento com algum colega, procure conversar abertamente com ele para esclarecer dúvidas e mal-entendidos. Não fale pelas costas, nem alimente sentimento de raiva, embora muitas vezes, o cara mereça engolir um grampeador inteiro.
8 – Em uma reunião ou conversa informal com colegas, respeite a opinião alheia. Argumente, apresente suas idéias e opiniões, mas procure ver os pontos positivos da idéia sugerida pelo colega, mesmo que não concorde 100% com ele.
9 – Quando alguém começar a ofendê-lo, não interrompa e não levante sua voz. A pessoa irá parar de falar porque verá que tal atitude é desnecessária.
10 – Aprenda a agradecer a ajuda com humildade, é importante saber trabalhar em equipe.
11 – Seja pontual, respeite a diretrizes da empresa, mantenha o bom humor, sua mesa organizada e sua sala limpa e iluminada.
12 – Se vista com asseio e valorize sua imagem usando roupas, acessórios, maquiagem e perfumes discretos.
13 – Responda a todos os emails ou sempre que for questionado de alguma forma e não somente, quando lhe convier. Seja objetivo e educado em todas suas mensagens, as escritas ou as verbais.
14 – Inclua na mesma conversa, todas as pessoas presentes no ambiente, para que haja entrosamento e para que todos possam conversar mais à vontade. Não participe de “panelinhas”.
15 – Se tiver que colocar seu ponto de vista para seu chefe, levante a cabeça e exponha com segurança e fundamento, seus argumentos. Defenda sua idéia, apresente soluções para os problemas, acreditando no seu potencial, sem perder o respeito ao seu superior.
Todos têm qualidades e defeitos, mas se tivermos cuidado para não cometer deslizes, cuidarmos das nossas tarefas com responsabilidade e construirmos uma boa relação com nossos colegas, a vida profissional se tornará mais fácil e agradável.

E, para finalizar, talvez a dica mais importante: faça o que você gosta. Nenhuma das dicas acima terá valor, se você não estiver feliz com sua profissão!


Karime Abrão

domingo, 9 de maio de 2010

Mãe


Mãe, mamãe, mamis, mamita, mãezinha...
Mãe de sangue, mãe adotiva, mãe postiça
Mãe preta, mãe branca, mãe azul, mãe vermelha, mãe verde, mãe roxa, mãe amarela
Mãe jovem, mãe madura, mãe idosa
Mãe-irma, mãe-avo, mãe-tia
Mãe-madrinha, mãe-amiga, mãe-vizinha
Mãe d’água, mãe da terra, mãe de santo
Me daqui, mãe dali, mãe de lá, mãe de acolá
Mãe próxima, mãe distante
Mãe que viaja mãe que não sai de casa
Mãe menina, mãe mulher

Não importa a cor, a etnia, a crença, o time que torce
Mãe do pai, mãe da mãe, mãe do irmão
Mãe de rico, mãe de pobre, mãe remediada

É tudo mãe!
São todas as melhores
Todas têm o amor eterno, amor incondicional
Único amor garantido

Mãe não mede esforços, não mede perigo
Mãe não vê beleza, mãe não vê feiúra
Mãe é mãe, e não há nada melhor
Aminha mãe, a tua mãe, a nossa mãe
São sempre as melhores

Mãe é assim, é tudo pra mim, é tudo para você
Opinião unânime, mãe maior, mãe melhor
Mãe única!

Parabéns mãe, obrigada mãe, valeu mãe.
Você é a melhor mãe do mundo, vocês são as melhores mães do mundo
Mães super poderosas
E não há pessoa no mundo que possa mensurar seu amor
Não há filho o mundo que possa agradecer seu amor

Parabéns para todas as mães
Todo dia deve ser seu dia
Porque amor de verdade é só amor de mãe!


Fernanda Bugai

sábado, 8 de maio de 2010

Confissões De Uma Noiva Em Fúria


Eu já nasci cheia de idéias, transbordando planos e criando expectativas. Brincava de boneca, sonhando com filhos; dialogava solitária com meninos, sonhando com uma eterna união; cozinhava e limpava na minha mini casinha, sonhando com uma família e um lar para cuidar... criança sonha forte e crê tanto no que almeja que não sente medo do futuro e sai fazendo promessas ao léu. Eu prometi uma Ferrari pro meu pai, jurando de fazer cruzes com os dedos do meio e indicador, para depois aproximá-los de meus lábios e beijá-los. Se ele me olhava com ar de graça dizendo amém, eu já entendia que ele não confiava em mim, e meus olhos ficavam marejados em lágrimas.
Já quis ser de tudo na vida. Quando bem nova, eu realmente desejava me tornar uma freira e inclusive já corria atrás das informações e procedimentos para preparar tudo o quanto antes. O engraçado é o que me motivava a querer seguir tal “profissão”. Por sempre ter me achado uma pessoa ruim, na verdade desde os 5 ou 6 anos de idade, eu acreditava que o único jeito de Deus me perdoar e de eu não ir para o inferno, era me tornar uma freira. Eu tinha medo de mim mesma e do que eu seria capaz de fazer, mas o meu medo por Deus era de tamanha proporção que eu estava disposta a ceder minha vida por ele.
Já sonhei em ser atriz, cantora, apresentadora de TV e pop star, como toda boa criança. Até americana e irmã gêmea eu já quis ser. Queria ser engenheira para construir os brinquedos dos parques de diversão, arquiteta ou paisagista, para fazer projetos ousados que só um louco compraria, estilista para poder ter o armário dos meus sonhos, dentre tantas outras atividades que mal eu me lembro.
Na escola, quando eu respondia aqueles cadernos de confidência, repleto de perguntas bobinhas e ousadas, eu hesitava na questão: O que você quer ser quando crescer? Porém, como eu já tinha algumas tantas opções, eu decidia na hora por aquela que, se naquele instante, surgisse um gênio da lâmpada e adiantasse o tempo em uns 10 anos, eu escolheria.
A pergunta mais difícil, e que eu sempre deixava por último, era “Qual o seu maior sonho?”. Primeiro que, pelo que eu me lembro, eu não tinha sonhos concretos naquela época, a não ser ir pra Disney ou ganhar qualquer torneio de tênis. Segundo que, escrever aquilo para todos lerem e realmente acreditar que aquele era meu grande desejo, seria como estar gastando fichas com bobeiras. Por isso, demorei alguns anos até ter certeza de qual era meu sonho, e quando eu descobri, tratei obviamente de espalhar para todo mundo. Era uma delícia saber que finalmente, havia algo que eu realmente desejava e eu já podia falar “O meu maior sonho é...”.
Bem, ingênuo ou não, pelo menos meu pedido era fácil de ser realizado. Eu queria uma banda de rock. Convenci minhas amigas a se juntarem a mim, e já estava tudo encaminhado. Tínhamos até letras de músicas e o nome do conjunto. O único e grande problema eram justamente os instrumentos. Ninguém sabia tocar nada, mas todas estavam dispostas a aprender. Porém, meu pai se negou a aprovar a idéia. Pedi um violão de Natal ou aniversário, e ele literalmente riu da minha cara. Pedi para ter aulas de violão, e ele, me enchendo de esperanças, falou pra eu procurar algum local perto de casa que fosse barato e quando eu o achei, ele riu da minha cara. Cheguei a ceder as suas chantagens, quando ele falou que se eu continuasse com as aulas de natação eu entraria para as de violão. Continuei a nadar, e ele riu da minha cara.
Demorei a desistir, mas a hora chegou. Frustrada, eu cansei de tentar por uma coisa que acabou me parecendo impossível, e fiquei novamente sem sonho algum.
Foi pensando nisso, ainda menina de 13 anos, que notei que sempre tive um objetivo ao qual lutar e que me acompanharia por toda minha vida, até que eu o conquistasse. Não muito criativa, mas nem por isso desonesta, eu desejava encontrar meu príncipe encantado, entrar em uma igreja toda enfeitada usando um belo vestido branco, e dizer o tão imaginado sim. Quando eu via filmes românticos, era impossível agüentar as lágrimas no momento em que a noiva aparecia à porta da igreja, sobre o olhar fascinado dos convidados.
Esperava ansiosa para que o tempo passasse logo, e chegasse o meu dia.
Com passar dos anos, sonhos surgiram e se foram com a estação. Na maioria das vezes, por desestímulo do meu pai. Talvez alguns pensem que se pra mim foi tão simples desistir, eu estava enganada quanto ao que realmente queria. Mas só eu sei exatamente o que passei.
Escrevi uma lista para fazer uma estatística de quantos planos foram arruinados pelo homem que dorme á 5 metros de mim há quase 19 anos, minha idade. O resultado foi terrivelmente assustador. Seria como se seu maior inimigo morasse no mesmo teto que você.
Mas a vida não pára. Aprendi a lidar e cuidar daquele que me fez mal, e tratei de continuar seguindo, mesmo que minhas lágrimas tivessem secado incontáveis vezes durante tão pouco tempo.
Apesar de tudo, não tenho dúvidas de que tive muita sorte. Encontrei o meu príncipe encantado, e para minha felicidade, mais cedo do que eu imaginava.
Estávamos correndo com preparativos para o casamento, mais do que contentes com a incrível aceitação da minha família, quando um dia, como se estivesse contando que comprou uma bolsa na feira, minha mãe me diz que o casamento foi cancelado. Simples assim. Faltando apenas dois meses, o pacote da lua de mel comprado, vários convidados já com suas passagens pagas e emitidas, inclusive minha sogra, que vinha de Portugal, eu descubro que o casamento não iria acontecer.
Não tive palavras ou reação para expressar o que senti. Minha mente tentava absorver o fato ao mesmo tempo em que meu corpo tentava esboçar alguma reação, como se temesse explodir. Eu era uma vítima de mim mesma, sem controle algum do que acontecia com meus sentidos. A angústia era tanta que qualquer sinal de vida que meu corpo demonstrasse me irritava. Era como seu eu me esforçasse para acreditar que aquela vida não era a minha, aquela família e aqueles problemas não me pertenciam, e eu estava ali só para assistir a tudo. Tive uma imensa vontade de dormir por um dia inteiro, para acordar, tomar água, comer e voltar a dormir. Queria poder seguir assim, para todo o sempre, sem complicações, totalmente alheia ao mundo e a mim mesma. Porém, o máximo que consegui foi evitar qualquer pensamento ligado a casamento, desde enxoval até a lua de mel. Na verdade, evito qualquer pensamento que me lembre que ainda estou aqui. Comer, já não me faz mais sentido. Tudo o que coloco na boca, parece empelotar e virar papel.
O pior é ter que manter a pose e fingir que está tudo bem.
Como já ocorreu em tantas outras vezes, sinto o meu corpo, a minha alma, ou qualquer parte ou todo de mim, se esfarelando irreversivelmente. Se em outras vezes consegui recuperar os pedaços que me compunham, hoje o que eu sou já está danificado.
Me sinto frágil, prestes a me esvair junto com a primeira brisa que quiser me levar.
Que tudo seja só uma tempestade passageira.
E que o inverno venha sem brisas, ou que pelo menos passem bem longe de mim.


Letícia Mueller