domingo, 16 de maio de 2010

Aroldo E Sua Diva


- Manoela minha diva, o que temos para o jantar de hoje?
- Manoela não Aroldo: Lady Malu! Respeite-me porque uma vez diva sempre diva.
Manoela ou Lady Malu, é uma mulher já de certa idade, na sua juventude havia feito bastante sucesso nas radio novelas e nos palcos de teatro do Rio de Janeiro, havia saído em turnê por todo o Brasil com algumas peças, com outras até despontou na Europa. Mas tudo aquilo foi há 40 e poucos anos, o nome artístico claro: Lady Malu. Não teve filhos, a dedicação pela arte lhe exigiu muito, o tempo não sobrou para a maternidade tampouco para manter algum de seus seis ou sete casamentos.
- Pois bem Lady Malu, o que temos para o jantar de hoje?
- É... Pois é... Então, acabei não fazendo nada porque você Aroldo esta um balofa desse jeito não haverá roupa que caiba em você. E eu como uma diva que sou não posso me dar ao luxo de comer depois das 18 horas, melhor mesmo é fazermos um jejum.
Aroldo seu fiel mordomo desde os velhos e bons tempos, hoje um companheiro para dividir a quitinete de subúrbio, sabia que Lady Malu era orgulhosa demais para admitir que ele deixara a muito de ser o seu mordomo, sabia também que jejum a noite nunca foi agradável para a diva, mas ela jamais admitiria que seus 500 e alguns reais fossem pouco demais para garantir o jantar do mês inteiro quando se tem que pagar o aluguel, condomínio, luz e água.
Mas a amizade a admiração pela Lady foram tantas ao longo de todos estes anos que Aroldo seria incapaz de desafiá-la tampouco deixá-la a deriva.
- Você tem toda a razão minha diva, vou aproveitar para dar uma volta no calçadão, até mais.
- Até mais Aroldo, ficarei aqui tratando minha beleza no silêncio e no escuro.
- Seu Manoel, por favor, o de sempre, o meu agora e outro para viagem.
- Pois é pra já Aroldinho!
E Aroldo como em todas as noites repetia, foi até o boteco da esquina e com os poucos tostões que lhe sobrara - já que sua aposentadoria era um tanto maior que de Manoela pois Aroldo na juventude poupara seu salário e Lady havia sido generosa enquanto podia com seu salário, enquanto ela mesmo torrou tudo em produtos de moda e beleza – comprou dois sanduíches completos e uma garrafa de suco. Comia o seu no boteco e levava outro sanduíche e meia garrafa de suco para Lady Malu, que saciava sua fome pela noite, as escondidas de Aroldo, como se aquele ritual fosse uma verdade velada entre eles.
Esses rituais ocorreram por anos, mas Lady Malu nunca conseguiu admitir que dependesse de Aroldo por tantos anos e pior ainda, que a fama, o glamour e o sucesso a abandonaram há bastante tempo...
Aroldo, no entanto guardava um respeito e admiração enormes pela diva que aos seus olhos jamais deixara de ser uma diva, afinal foi ela quem acreditou em Aroldo quando a família o abandonou, quando estava entregue ao alcoolismo. Não foi Lady Malu, mas a amiga Manoela quem lhe estendeu a mão, pagou seu tratamento, lhe deu um emprego de mordomo com altíssimo salário para a época e lhe carregou para todos os lugares do mundo permitindo a Aroldo oportunidades que a vida jamais lhe proporcionaria.
Por essas e por outras se fez uma grande amizade, recíproca e verdadeira, ele ajudava ela e ela o ajudava, até o fim assim seria, eram a família um do outro. Juntos descobriram que viver para a arte é sempre uma arte.



Fernanda Bugai

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