sexta-feira, 8 de abril de 2011





Descanso para Todos





Uma das maiores causas de insônia que pertuba, a cada segundo, milhões de pessoas em todo o mundo, é o pensamento. Certa vez li que, todos os dias quando formos nos deitar, devemos pensar nas principais coisas que fizemos durante o dia e focar principalmente nas ditas boas e más ações. Refletindo sobre nossos atos, deveriamos analisar o que não seria certo repetir, melhorando assim nossa conduta com a sociedade. Porém, quando nos dispomos a pensar nos valores éticos de nossos atos, o que acontece é que somos tomados, na maioria das vezes, pela perturbadora auto crítica que nos mostra o quanto ainda devemos melhorar.


E isso não é ruim, bem pelo contrário. Mas, se formos analisar relamente tudo que fizemos desde o momento em que acordamos, lembramos daquele papelzinho de bala que voou sem querer de nossa mão, indo parar no jardim do vizinho, da irritação desnecessária com a moça do caixa do restaurante, que no momento parecia ser a culpada da demora no atendimento e do tamanho da fila, da pequena infração de trânsito no horário de pico, quando nada mais importava a não ser escapar do caus motorizado. Ou ainda pensamos no banho quente, que só daquela vez durou cinco minutinhos a mais, ou naquele email que você sabia que iria para o lixo na faxina de fim do ano, mas resolveu imprimi-lo mesmo assim.


Erramos todos os dias, alguns mais, outros menos, tantos outros sem querer e outros tantos tendo plena consciência do que estavam fazendo. Alguns atos são tão ínfimos que até poderiam passar ilesos por nossa consciência, mas não passam, e nos deixam remoendo o que poderia ser simplesmente encarado como um aprendizado. E é quando penso no peso que tenho em minha consciência por uma resposta mal educada que dei por impulso ou no pensamento fútil e preconceituoso que tive sobre uma nova colega de trabalho, que me pergunto o que os verdadeiros errantes pensam antes de dormir. O homem que decidiu entrar em uma escola no Rio de Janeiro em que estudou para exterminar crianças, por exemplo. Talvez nem um psiquiatra saiba dizer o que pensa uma pessoa dessas antes de dormir, se é que uma mente em tal estado consegue ter algumas horas de descanso.


Questionar-se sobre qual a verdadeira intenção do seu ato, a sua motivação real, é como tentar explicar o inexplicável, o que simplesmente não tem resposta no campo do que chamamos de razão, ou até do sentimento. Pior ainda é tentar imaginar o que esse homem pensaria quando fosse obrigado, indireta ou diretamente, a refletir sobre o seu ato. Ou ainda o que ele analisaria sobre si mesmo antes de dormir. Que tipo de pessoa é esta que eu, até então, mesmo com a realidade do mundo violento em que vivemos, insistia em acreditar que existia somente em filmes? Talvez, em um momento de lucidez, depois de ter acabado com a vida de tantas crianças inocentes, ele também se tenha feito essa pergunta. Se ele obteve ou não sua resposta, não há como saber, mas talvez o fato de ele ter se matado responda a muitas dessas questões. Uma pessoa sem consciência deve ter o seu merecido sono eterno.





Leticia Mueller



Fonte:
http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1113772&tit=Sobe-para-12-o-numero-de-alunos-mortos-por-atirador-no-Rio

Foto:Reprodução

Um comentário:

Cristina disse...

É, querida.
Precisamos começar a acertar por dentro. Assim, eu acredito que o nosso mundo melhore.

Gerar algum pensamento de luz, em meio a tanta escuridão é o que nos resta.
Afeto.