quinta-feira, 9 de dezembro de 2010


Fora de Órbita



Oi, meu nome é Ana, tenho 17 anos e vou contar a história de um infeliz da minha escola. O Clécio. Clécio é um cara idiota. Idiota mesmo, do tipo tapadão, daqueles que não tem boca pra nada, é mandado pela mãe e freqüentemente puxa assuntos sobre o tempo. De aparência meio exótica poucos atrativos físicos, cheio de manias e que só não era virgem porque passava as noites da semana decorando cantadas pra chegar nas meninas. Um dia, por pena, uma delas resolveu fazer uma caridade. Enfim, um verdadeiro paspalho.
Filho de pais quadrados, tinha uma família devota da Igreja. Estudou em bons colégios, freqüentou aulas de línguas, música e jogou no time de críquete do clube. Até os 13 anos era até que bonito, chamava a atenção pelos olhos cor de jaboticaba, pele branca e jeito tímido. Se concentrava mais nos estudos, gostava de ajudar as pessoas mas não era muito sociável. Na verdade dava a impressão que faltava coordenação pra falar e respirar ao mesmo tempo. Tinha uma paixão: as estrelas. Passava horas olhando pro céu e contando pontos luminosos, estudando a posição dos planetas e tentando descobrir um jeito de ir pra Marte. Não seria má idéia, ele era quase um ET mesmo de tão idiota.
Um dia avistou Marina, uma daquelas meninas que anda com sainha de prega, meia até o joelho, duas maria-chiquinhas e geralmente está com um pirulito enorme nas mãos. Sim, ela existia. Cada olhar seu era como se o tempo andasse lentamente, seu sorriso era como o nascer do sol, seu andar como uma marola carregando a areia para a praia e essa descrição dele sobre ela sempre me dá enjôo. Clécio babava por ela e como tocava violão, não tardou para que a moça, que gostava de música, também percebesse seus talentos.
Em uma tarde, logo após a aula de Filosofia, Clécio estava sentado debaixo de uma árvore, lendo revista (devia ser de mulher pelada), quando deu de cara com as pernas da Marina. Lentamente olhou pra cima com cara de bobo mesmo (essa foi a primeira de uma série) e disse meio gaguejando: “Oi”. A doce, sedutora e insuportável Marina ajoelhou-se lambendo seu grande pirulito e respondeu: “Oi Clécio. O que acha de sair comigo essa noite pra ver as estrelas?” Lógico que o paspalho aceitou, na hora, até parou de babar pra perguntar que horas poderia pega-la. Foram até o observatório local e passaram duas horas falando de estrelas, universo, planetas e afins até Marina pular indecentemente nos braços de Clécio que, como todo idiota, ficou sem saber o que fazer. Restou-lhe beijar a moça que o fez ir até o céu com seus carinhos.
Começaram a namorar e ainda hoje passam a noite observando estrelas. Eu nunca vi nada nesse idiota, inclusive na época em que ele corria atrás de mim dizendo que queria olhar as estrelas comigo. Não sei o que pode ter de tão bom em ficar olhando estrelas e ouvir o quanto você é amada, e nem sei muito menos qual o gosto daqueles pirulitos coloridos. Sei que Clécio é um idiota, idiota mesmo, do tipo tapadão, do tipo que fica orbitando na minha cabeça, do tipo melhor amigo, melhor parceiro, do tipo que eu odeio... do tipo que eu amo.


Angelica Carvalho

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