domingo, 21 de março de 2010

Quando A Demissão É Uma Benção


Todo mundo tem algum ranço com seu emprego. Ou é um motivo clássico, como chefe mal humorado, ou é um que está classificado na lista dos específicos, como uma dada função que você é capaz de dar todo o seu salário para um terceiro executar. Mas há atividades profissionais, que, convenhamos, ninguém merece. Não entraremos nas mais óbvias, como vigia noturno, mas sim naquelas um tanto insuspeitas e que causam tormento tanto para quem executa quanto para os parceiros e até para os “beneficiados”. Levante as mãos para os céus e admita que seu trabalho é minimamente suportável.

Ativista ecológico
Você está lá no seu navio, pescando umas baleiazinhas quando, de repente, seu binóculo aponta um patético objeto laranja singrando as águas turbulentas e geladas do Índico: lá vem uma tropa de ecochatos. Umas quatro ou cinco criaturas trajadas em roupas de mergulho, num bote inflável a motor e todo remendado de silver tape, com uma bandeirinha fincada na popa e um cidadão em pé berrando palavras de ordem num megafone. Claro que aquela pulguinha no oceano não tem como ser ouvida, então, nada mais natural do que o seu gigante dos mares passar por cima. Ops, tchibum!

Atração de abertura de mega star
Se você é um ídolo que possui milhões de fãs ardorosos que o idolatram mais que a própria mãe, não vai querer decepcioná-los quando for dar o ar de sua graça em um estádio no qual pagaram o salário do mês para entrar, não é mesmo? Mas também não vai querer deixá-los entediados esperando por horas a sua entrada triunfal em cena. Então, você escala uma banda ou músico mais ou menos famoso para abrir seu imponente espetáculo. A atração tem de ser meia-boca, senão estraga seu show. O som tem de estar bem mais baixo que o seu. E a iluminação e os efeitos têm de ser mínimos ou precários. Claro, o público estabelecerá uma relação comparativa direta entre quem abriu seu show e você. Ou seja, depois de suportarem uma hora da tal “atração”, você passará a ser catapultado da categoria de semi-Deus para ser o próprio. Enfim, a banda coadjuvante toca sabendo que praticamente ninguém naquele estádio lotado pagou para vê-la. O que foi Richard Ashcroft abrindo para Madonna no Brasil, um cara que além de adotar um estilo muitíssimo diferente do da “musa” faz uma carreira solo que lembra Paulo Ricardo pós-RPM e pouco sustenta de seu brilho dos tempos de The Verve... O fato é que nenhum superstar, de U2 a Beyonce, quer pagar o mico pelo qual passou certa vez Chuck Berry, que viu Jerry Lee Lewis arrasar na abertura e o deixou em situação embaraçosa diante de uma plateia que queria mais do pianista ensandecido. Na minúscula lista dos que recusaram ganhar uma baba e a “honra” de abrir para uma mega banda estão os Stone Roses dos bons tempos – rechaçando a proposta de Mick Jagger para que abrissem sua turnê nos Estados Unidos, o vocalista Ian Brown argumentou: “eles é que tem de abrir pra gente”. Sentiu?

Vendedor de enciclopédia
Acredite, ainda existe. Claro que os volumes agora vem em um multimídia para rodar no PC, mas essa atividade em extinção está mesmo com os dias contados. Dizem que a associação está planejando um atentado contra o criador do Wikipedia.

Atendente de telemarketing
Nem vamos estar explicando.

Palhaço de rodeio
Olha só: um cara esmaga os testículos de um bovino, monta no pobre, espora-o até sangrar fazendo o animal dar pinotes de dor, faz pose de herói em cima do bicho e cai glorioso no chão de serragem para os aplausos de uma plateia alcoolizada e de escabroso gosto musical, que o ovaciona como um Hércules contemporâneo. Claro que o pobre do touro quer ir à forra, mas aí é que surge a figura do palhaço de rodeio, que protege o valentão enquanto ele sai de cena para pegar seu cheque de 200 mil e a chave de sua pick-up zero quilômetro pelo feito de bravura que protagonizou na arena. Ou seja, quem na verdade mais corre risco é o trouxa do palhaço, que vai voltar pra casa de busão na madrugada, não recebe aplauso nem prêmio e, ainda por cima, protege um Jeca que pensa ser pop star. Ou seja, é um palhaço mesmo.

Estátua humana
Esse sim é um expediente que, ao longo de um mês, fará o “profissional” da área gastar todos os seu rendimentos com um ortopedista. Ficar na mesma pose, pintado com uma tinta que tapa todos os seus poros, e só se movimentando quando algum transeunte deixa cair na caixinha uma moeda de R$ 0,50, é realmente de doer até os ossos. Isso que nem falamos daqueles momentos em que baixa uma coceirinha insuportável...

Ascensorista de elevador
O dia todo subindo e descendo. O dia todo aquele fudunzão de gente suada se acotovelando. O dia todo confinado num espaço ínfimo. E o mais bizarro, o dia todo ouvindo histórias pela metade: “ah, menina, daí sabe o que eu disse pra ele?...” (plim!), “bom, prima, vou te contar um segredo de como ganhar na mega sena, é assim... (plim!), “saca só, pra conquistar as mulheres é preciso apenas um truque...” (plim!). Além disso, você tem de encarar os moradores ou trabalhadores do edifício fulos com a conta do condomínio e se indagando por que estão pagando alguém para fazer algo que eles próprios poderiam executar sem qualquer dificuldade. Na verdade, os ascensoristas deveriam todos... (plim!).

Maquiador de cadáver
No ano passado, uma produção cinematográfica japonesa ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro exibindo a vida de um cara pago pra deixar quem morreu mais bonitinho. Só mesmo a sétima arte pra tornar estimulante essa profissão, porque na vida real ela é, no mínimo, bizarra. Seu trabalho só vai ser “apreciado” por algumas poucas horas, e vamos combinar que passar base e blush em uma carne em estado de putrefação (ainda mais humana) não é uma rotina das mais desejáveis. A favor da atividade existem os bons rendimentos, o atendimento a clientes que nunca reclamarão da qualidade do seu trabalho e o fato de você praticamente não ter concorrência. Afinal, quem se habilita?...

Desentupidor de fossa
Você vai nas casas dos outros para dar um jeito na merda alheia. Ganha mal, as pessoas têm receio de cumprimentá-lo, o olham com pena e acham que você está sempre fedendo, mesmo se encharcando de L’Acqua di Giorgio Armani. Enquanto para as outras pessoas “entrar na maior fossa” é sinal de depressão, para você é ganha-pão. Chega a justificar a eutanásia por motivos profissionais.

Claque de programa de humor da TV
Já imaginou ser pago para rir histericamente das piadas brilhantes do Paulo Silvino e de outros gênios da comédia televisiva? “Cara, crachá, cara, crachá”, e você: “HAHAHAHAHAHAHAHAHA!!!”; “Ai, como ela é grande”, e você: “HAHAHAHAHAHAHAHAHA!!!”. Pois é, talvez seja a única profissão em que, mesmo rindo, você tem vontade de se matar.

A lista vai longe. Na verdade, a profissão eleita como a mais insuportável do mundo foi a de masturbador de animais. Sim, há gente paga em certos zoológicos para recolher o sêmen da bicharada, incluindo dos leões (ai do cara se não caprichar...). Apesar de esta atividade envolver alto risco, uma outra foi apontada como a mais perigosa: escovador de dentes de tubarões. Inacreditável, né? Mas existe. Já no hall das mais estressantes estão: jornalista (terceiro lugar), médico cirurgião (segundo) e motorista de ônibus urbano (líder absoluto, sendo que em dias de jogo de futebol o nível de stress é equivalente ao de um jornalista fazendo uma cirurgia). Mas tem ideia de qual é a profissão que mais causa suicídios? Dentista. Se você acha estranho, então imagine o que é passar seu dia em um espaço de 5x5, debruçado sobre bocas, encarando mal hálito e tártaro, sabendo que ninguém foi até você porque quer, e, durante o jantar, ter para contar à esposa que seu momento mais emocionante do dia foi um tratamento de canal na boca de um lutador de vale-tudo que era muito sensível. Masturbar um hipopótamo agora já não parece algo tão ruim assim, não é?


Mario Lopes

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