segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Semana de Tema Livre


Fruto do meio





Karolyne nasceu numa típica realidade brasileira, a mãe viciada em drogas prostituía-se, e não para garantir o sustento dos filhos, mas seu vicio, o sustento era conseqüência. Irmã de mais cinco, cresceu vendo a mãe receber dois, três, quatro ou cinco homens por dia no único cômodo da casa, viu cenas mais do que inapropriadas para qualquer pessoa. Aos oito anos foi vendida para o dono da mercearia da esquina, sua virgindade por três maços de cigarro e alguns trocados, depois vieram os açougueiros, o feirante, o tio da pracinha e claro, os traficantes da vila, Karolyne jamais soube porque fazia aquilo, não era ela a drogada, não ela era quem recebia algum dinheiro, mas foi aos oito anos que descobriu que a vida não é tão legal quanto nas novelas da rede globo.
Quando ela tinha onze anos, seu corpo e alma já estavam, tal qual a mãe, consumidos pelo crack, as senhoras da assistência social resolveram mudar sua vida, chamaram pelo conselho tutelar, que tirou Karolyne daquela vida, e a menina-mulher de onze anos foi para uma casa lar, dessas que os menores ficam abrigados quando seus pais não possuem condições de criá-los. Na casa-lar, teve que retornar a escola, terceira série, conviver com meninas de nove ou dez anos que achavam que a barbie era a sensação do momento, enquanto Karolyne já conhecia as facetas do lobo-mau, freqüentara a missa aos sábados, bordava e lia contos infantis durante as tardes, tudo até a primeira crise de abstinência, onde Karolyne sem titubear tomou outro rumo na saída da escola, sabia bem como chegar até a praça da cidade sabia também como fazer para conseguir cinco ou dez reais por uma pedra, ela sabia ainda, que aqueles homens com cara de inocentes sentados nos bancos esperavam apenas um gesto daquela garotinha.
Quando foi capturada novamente pelo conselho, numa vala qualquer, em puro osso e corroída pelas drogas, karolyne foi novamente submetida a ressocialização, banho, higiene, escola, curso e literatura, também descobriram que já não estava sozinha, havia engravidado de alguém que jamais saberia quem, Karolyne foi encaminhada ao reformatório da capital, de onde fugiu tantas outras vezes, engravidou, abortou e retornou, até completar seus dezoito anos e definitivamente o estado deixar de ser o responsável por ela.
Talvez se Karolyne nascesse em outras circunstâncias, teria estudado filosofia, os grandes pensadores e até simpatizasse com Thomas More, e seus ideais de que o homem será bom quando submetidos à lei e costumes, mas mesmo sem nunca ouvir falar em filosofia, de uma maneira real e cruel, Karolyne acreditou no que disseram Maquiavel e Marx, o homem é mau por natureza e fruto do meio em que vive.



Fernanda Bugai

Nenhum comentário: