sexta-feira, 2 de abril de 2010

Se Sim Ou Se Não...


Eu tenho uma história para contar. Uma história engraçada, aleatória, assim meio bizarra, fora do normal. Deixaria de ser apenas um sonho ou uma fantasia maluca, não fosse a realidade com que eu via e sentia as coisas.
Deveria ser umas 2 da manhã. O asfalto ainda estava aquecido pelo sol e soltava uma fumaça fantasmagórica. Minha cabeça explodia e eu, já cansada de ficar no bar e louca para capotar em uma cama, resolvi me despedir de todos e ir embora. Não havia ônibus numa hora dessas, pelo menos não em dias de semana. Era uma quinta-feira.
Como eu não estava tão longe de minha casa, chamei um táxi e fiquei aguardando em frente a um lugar qualquer, mas bem iluminado. Depois de esperar por 15 minutos, eu, já impaciente, estava ligando para a companhia de táxi quando a rua foi iluminada por uma luz estranha que se aproximava lentamente, tornando-se cada vez mais forte até que eu só conseguia enxergar uma massa branca amarelada. Quanto mais intensa ficava a luz, mais alto ficava o barulho.
Bem, eu de tão nervosa por estar sozinha às duas da manhã em uma rua “esfumaçada” esperando meu táxi por 15 minutos, imaginei coisas muito piores do que um simples ônibus, comum como todos os outros. Então, assim que o ônibus parou e encostou no meio fio, eu assumi uma postura de mulher madura e corajosa e fui falar com o motorista.
- Boa noite, para onde vai esse ônibus?
Para minha surpresa, o motorista nada tinha de monstruoso ou sobre-humano. Tinha um rosto com nariz, dois olhos, boca e tudo o mais que tem direito. Nada faltando ou sangrando, só eu, suando atemorizada.
- Como vai para onde? Vai pra onde você quiser.
Rá! Eu sabia, eu tinha certeza que aquele era o ônibus da morte, que o motorista estava apenas fantasiado de humano, que tudo aquilo era diabólico e maléfico. Como se estivesse vivendo em um filme do Wes Craven, falei com os olhos arregalados, prestes a sair correndo:
- O... quê?
O motorista, ao ver minha reação, explode em uma crise de risos tão pura, ingênua e intensa que começo a rir também.
- A dona não vai me dizer que levou a sério o que eu falei, vai? Disse o homem, recuperando o fôlego, com lágrima nos olhos.
Quando eu, envergonhada, abri a boca para respondê-lo, um casal de jovens entrou no ônibus conversando distraidamente sobre algum filme em cartaz no cinema. Tranquilizada, eu olhei para o cartaz que o motorista, indiferente, apontava com uma mão, enquanto a outra, já sobre a marcha, preparava-se para a partida. No cartaz, estava todo o itinerário do ônibus, e por sorte, o ponto que eu desceria era um dos próximos. O estranho era que o ponto ficava na minha rua, e eu nunca vi um ônibus passando por ali.
Na verdade, eu nem sabia que passava ônibus às 2 horas da manhã no lugar onde eu estava, mesmo porque se eu soubesse, não teria chamado um táxi.

Indignada comigo mesma ao pensar que aquilo ali poderia ser algo demoníaco, eu sentei e tentei me manter tranquila. Afinal, a Prefeitura não pode colocar mais um ônibus para circulação e criar novos pontos e novos horários? O que um ônibus pode ter de tão maligno? Nada, não é mesmo?
Bem, tentei permanecer calma, mas havia algo de estranho no ar. Os dois adolescentes, desde que foi dada a partida, tornaram-se quietos e atentos. Até soltaram suas mãos um do outro. O pior é que não pareciam estar apreensivos ou com medo como eu. Na verdade, estavam ansiosos prestando atenção em algo que não conseguia e nem tentava notar.
O motorista também. Desde que saiu daquele primeiro ponto, parecia ter perdido um pouco o seu ar de humano. Às vezes, quando eu olhava de canto de olho para ele pelo retrovisor, notava que também tentava me olhar sem que eu o notasse. Impossível.
Até poderia ser tudo invenção da minha imaginação, mas algo me dizia que havia ali algo de errado.
Dizem que intuição feminina nunca erra, porém tudo o que eu mais queria naquele instante é que a minha estivesse totalmente enganada.
Eu queria descer daquele ônibus e ir a pé, mas sinceramente não sabia aonde era mais perigoso, se ali dentro, ou lá fora, nas ruas escuras e abandonadas.
O motorista não parava de me olhar. Já havia desistido de tentar ser discreto, e praticamente me dissecava com os olhos.
O casal de jovens começou a ficar inquieto. Ficavam de cochichos, enquanto gesticulavam e olhavam para a janela. Eu até tive a impressão de ter ouvido o meu nome, mas como era possível? Não era. Porém, eu poderia jurar que seus olhares estavam direcionados para mim, e que, pela minha intuição de leitura labial, diziam algo como "vamos matá-la" ou "ela tem que morrer".
Eu estava nesse impasse, quando vi que o casal se levantou rapidamente. Pelo sim pelo não, e mais desesperada do que qualquer outra coisa, corri para a porta no mesmo instante que o motorista parava o ônibus.
Para minha surpresa (tive mais surpresas nessa última hora do que já tive em minha vida inteira), o motorista, ao me ver em frente à porta, abriu-a sem problema algum.
Saí correndo feito louca pela rua, sempre olhando para trás em busca de um casal de jovens zumbis, um motorista ensanguentado, e um ônibus fantasma.
Bem, cheguei em casa viva, agradeci às minhas pernas ágeis pelo bom trabalho e por terem me salvado, e pela maldita companhia de táxi que foi responsável por tudo isso.
Desde esse dia, eu não ando mais de ônibus à noite, e não voltei àquele bar para checar se o tal ponto realmente existia ou não.
Confesso que não quero saber. Se for verdade, nunca mais me sentirei segura.

Se for mentira? Passarei o resto da vida me tachando de desequilibrada e psicótica.
Agora, se você me perguntar se eu acho que aquilo realmente aconteceu da forma que imaginei, eu não sei responder.
Mas confesso que... bem, eu deveria ter ficado lá, pelo menos pra ver qual seria o final da história, não é?
Tá bom, chega. Eu só era a figurante do filme do Wes Craven, confesso.






Letícia Mueller

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu acho que já peguei esse ônibus...


hahaha brincadeira, vc não me levou a sério, levou?

;-)

beijos

Angelica