quarta-feira, 7 de julho de 2010

Tudo É Vaidade


Calebe não era o tipo que gostava de estudar, mas sempre se deu muito bem em tudo o que fez. Desde novo já sabia negociar. Com sete anos eram a figurinhas, aos dez jogos de videogame, ao doze comercializava celulares usados e aos quinze... bem, aos quinze mostrou a que veio ao mundo. Sua especialidade tornou-se a venda do prazer. Sim, o garoto ao quinze já era cafetão. E pensa que ganhava trocadinho? O cara era bom, tinha uma lábia que adoeceria uma beata.
Nem era tão bonito assim, mas o charme... e foi numa noite, em um bar, com esse olhar que ele laçou Raquel. Ela estava sentada no balcão com sua mala ao lado da cadeira esperando um lanche. Sozinha e perdida, nunca tinha ido lá e nem imaginava o tipo de programa que rolava. Quando virou em direção ao relógio na parede, deu de cara com os olhos do moço, insuportavelmente penetrantes. Ele perguntou se podia servir uma bebida e Raquel virou-se rápido vermelha como uma maçã. Baixou a cabeça e sussurrou um não envergonhado, o que fez Calebe chegar ainda mais perto. Tentou levantar-se para algum lugar mais claro, mas ele insistiu que ficasse, que não lhe faria mal algum, apenas queria conhecê-la melhor. Pediu ao garçom do balcão que trouxesse um Martini para Raquel e uma vodka sem gelo para ele. Brindou com a moça e perguntou-lhe o nome e o que fazia. Raquel respondeu que havia chegado à cidade há poucas horas e estava procurando por um hotel para passar a noite. No dia seguinte, seguiria viagem até a casa da tia na cidade vizinha aonde iria se preparar para entrar em um convento.
Aquilo soou como um sinal divino para Calebe. Pediu mais um Martini e perguntou:
- Mas... se você vai para um convento precisa ser virgem.
- Sim, claro. Deus não admitiria no convento uma moça que não fosse.
Celebe brilhou os olhos. Imaginou mais uma possibilidade de faturar alto.
- Sempre pensou em tornar-se freira?
- Não. Tive uma desilusão amorosa.
- Já pensou em trabalhar pouco e ganhar muito dinheiro?
- Do que está falando?
- De como você assim tão linda ganharia fortuna e teria tudo o que desejasse com um pequeno esforço.
- Não posso. Decidi que vou para o convento.
- Você não deve fazer isso. Estará desperdiçando uma oportunidade única.
- De que tipo de trabalho está falando? Eu não venderia minha vocação.
- De um que te trará muitas coisas. Dinheiro, festas, prazer... Terá o que sempre sonhou... E o melhor... poderá mostrar ao homem que a desiludiu que pode ter quem quiser. Nunca mais se sentirá sozinha, não vai mais chorar. Terá o que sempre desejou. Todos tem um preço. Minha oferta é tentadora não?
- Tentadora...
- Fazemos assim. Você fica durante um tempo. Se não gostar pode ir para sua vocação. Ninguém saberá. Será um segredo só entre nós. O que acha?
- Perfeito. A não ser por um detalhe.
- O qual seria esse detalhe? O que foi que eu esqueci? Disse Calebe, sorrindo com desdém.
- Eu vou indo.
Raquel deixou um sorriso de adeus e um bilhete em cima do balcão. Nas palavras de Chamfort, explicou a Calebe sua opinião sobre o destino:
“ A sociedade, que é chamada o mundo, não é senão a contenda de mil interesses mesquinhos e discordantes, um conflito eterno de todas as vaidades que se cruzam, se chocam, se ferem e se humilham sucessivamente, e expiam, no dia seguinte, na amargura da derrota, o triunfo do dia anterior. Viver só, evitar os ferimentos de encontros desventurados em que a pessoa atrai todos os olhares num minuto só pra ser pisada no minuto seguinte, é o que chamam nada, não ter existência. Pobre humanidade!”


Angelica Carvalho

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