sexta-feira, 11 de junho de 2010

Falatório



Eugênia e Alfredo estavam embaixo dos lençóis, mantas, colchas e edredons, no dia 12 de junho, Curitiba. Conversavam sobre a vida, simplesmente. Já passava das duas da manhã:
- Ai Alfredo, é tanta coisa que a gente vive né. Dava até pra escrever um livro.
- É...
- Pior que dava mesmo... da minha vida, da sua vida... da nossa vida. É Alfredo, que tal? Vamos escrever nossa história?
- Uhum.
- Vai ser demais... e outra né, hoje em dia todo mundo já escreveu um livro. Britney Spears, Kelly Osbourne, Miley Cirus... até a Paris Hilton, dá pra acreditar?
- Hum… até dá amorzinho, recebendo muito dinheiro qualquer um escreve pra outra pessoa e passa os créditos pra ela.
- Ai credo, você realmente acha que alguém seria capaz de...
Alfredo a interrompe:
- Acho. E também, que diferença faz? O livro deve ser um lixo do mesmo jeito.
- É, sei lá. Mas e o nosso? Vamos escrever mesmo, né?
Alfredo já começava a pestanejar.
- Uhum, claro que vamos amor.
Eugênia batia palmas e dava pulinhos na cama.
- Que massa amoor! Acho que vai se o primeiro livro escrito por um casal né?
Alfredo achou melhor não falar o que tinha acabado de pensar.
- Talvez seja sim, sei lá, diz ele, seguido de um longo bocejo.
- Vamos ficar famosos... como será que pode começar o primeiro capítulo?
Eugênia fecha os olhos, concentrando-se, quando de repente, dá um berro:
- NOOSSA! Tive uma idéia de gênio! Vamos começar contando como a gente decidiu escrever um livro sobre a nossa história.
Alfredo já estava de olhos fechados e a boca levemente aberta.
- Pode começar assim ó: “numa noite fria de inverno, em pleno dia dos namorados, nós tivemos uma grande idéia. Para selar nosso grande amor, resolvemos escrever um belíssimo livro, e ...
Ela olha para ele, irrita-se, chega bem perto de seu ouvido, e grita:
- ACORDAAA!
Alfredo dá um pulo e brabíssimo, diz:
- Ai meu Deus, que saco isso Eugênia. Só porque eu to de olhos fechados não significa que estou dormindo.
- Ah é? Então do que eu estava falando?
- Do primeiro capítulo, selar amor, etc..
- É...
Eugênia novamente fecha os olhos para se concentrar.
- Mas e... Ai, saco. E o desfecho? Tem que ser maravilhoso, não pode ser simplesmente um “The End”. Afinal, é o primeiro capítulo né? Tem que causar um impacto, dar um “tchãn” no leitor.
- Claro que não pode... Meu Deus.
Em pensamento, Alfredo fala para si mesmo:
- Ela deve ser pior que a Paris Hilton...
Eugênia fica indignada:
- Ah é? Então, porque você não dá uma idéia melhor? Se não, se continuar desse jeito, seu nome não vai nos créditos.
- Nossa, que tragédia.
Ela dá uma grande bufada, e vira para o outro lado, ajeitando-se para dormir.
Alfredo começa a pegar no sono, quando se lembra de algo, e fala no ouvido de Eugênia, todo dengoso:
- Amorzinho, você esqueceu do que me prometeu ontem?Hãn?
Ela não se mexe.
- Ei, não adianta fingir, eu sei que você tá acordada.
- Ai Alfredo, mas com esse clima? Você é todo grosso, estúpido.
- Ô benzinho, desculpa, mas é que às vezes... você né.. sabe?
- Não sei não Alfredo. E outra, nada a ver fazer agora... os dois com sono.
- Quem disse que eu to com sono?
- Você dormiu enquanto eu falava!
- Mas meu Deus Eugênia, nós estávamos desde às 10 da noite deitados, prontos para começar... e não sei que santo baixa em você pra você não parar de falar um segundo, sem parar, sobre qualquer assunto. Da onde essa idéia de escrever um livro? Eu estava só esperando você parar de falar pra gente namorar um pouquinho, mas sua língua tá sempre tão ocupada, enrolando um assunto atrás do outro. Que saco isso, Eugênia!
- Mas é que... Ai Alfredo, ontem eu estava uma pilha né... louca pra transar. Mas também, vendo aquelas lingeries maravilhosas, qualquer mulher fica. A gente se empolga sabe? Dia dos namorados é fogo, literalmente. Toda loja tem...
- Chega, mulher! Fala de uma vez, você quer ficar de papinho, ou namorar bem gostoso?
- Sabe o que eu não entendo? Essa obrigação de ter que transar no dia dos namorados... não faz sentido nenhum. E se eu tivesse menstruada? E se... Sei lá, todas as camisinhas do mundo tivessem acabado? Todo mundo ia querer...
Alfredo ronca, e acorda às 10 da manhã com a voz de Eugênia ainda falando sobre lingeries, dia dos namorados, sexo, Paris Hilton, “the end”, torta de queijo, pesadelo, Egito, e assim por diante.



Letícia Mueller

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